Pré-oxigenação e Oxigenação Apneica na Intubação
Este tópico foi atualizado com as informações do estudo PREOXI, veja uma discussão completa do estudo em "Atualização sobre Pré-Oxigenação: o Estudo PREOXI".
Dessaturação e hipoxemia durante a intubação estão associadas a eventos adversos graves. Duas estratégias utilizadas para evitá-las são a pré-oxigenação e a oxigenação apneica. Em abril de 2023, um artigo sobre o uso de cateter nasal de alta fluxo na oxigenação apneica foi publicado no Annals of Intensive Care [1]. Este tópico revisa o tema e traz os resultados do estudo.
O que é e como fazer pré-oxigenação?
Níveis de saturação de O2 (SpO2) abaixo de 90% ocorrem em um terço dos pacientes durante a intubação em sequência rápida. Esse é um evento potencialmente grave. Algumas consequências incluem instabilidade hemodinâmica, lesão cerebral hipóxica e parada cardiorrespiratória. O tempo que o paciente permanece com saturação abaixo de 90% aumenta o risco de complicações [2, 3].
Idealmente, deve-se manter a saturação acima de 92% durante a intubação. A queda da saturação ocorre de forma progressivamente mais rápida com a dessaturação. O maior ponto de deflexão da curva de dissociação da hemoglobina acontece com a SpO2 em aproximadamente 93% como se observa na figura 1 [4].
A estratégia mais usada e conhecida para prevenir a dessaturação é a pré-oxigenação. Ela consiste em oferta de oxigenação com alta fração inspirada de O2 (FiO2) imediatamente antes da intubação. A pré-oxigenação adequada deve ser mantida por pelo menos 3 minutos. A máscara não-reinalante (MNR), bolsa-válvula-máscara (BVM) ou ventilação não invasiva (VNI) podem ser usados para pré-oxigenação. Quando MNR ou BVM são usados, o fluxo de oxigênio deve o "flush rate". Isso significa girar a válvula do fluxômetro até o final, mesmo após atingir 15 L/min. Essa estratégia pode fornecer fluxos de 30 a 60 L/min, otimizando a oferta da FiO2. Na VNI utiliza-se FiO2 de 100%.
A escolha do dispositivo para a pré-oxigenação é feita conforme o risco de hipoxemia de cada paciente [5]:
- SpO2 > 95% (baixo risco para dessaturação) - pacientes colaborativos sem hipoxemia grave, a MNR é um opção adequada [6].
- SpO2 entre 91 e 95% (alto risco para dessaturação) - o uso de MNR, BVM com PEEP e CPAP é semelhante em pacientes colaborativos.
- SpO2 < 90% (hipoxêmico) - Em pacientes com hipoxemia grave e/ou necessidade> 10 L/min de oxigênio antes da intubação, há benefício do uso de VNI para aumentar o tempo de apneia segura [7].
A via aérea tem que estar adequadamente desobstruída e posicionada. Em casos de pacientes com rebaixamento do nível de consciência e ventilação espontânea inadequada (musculatura cervical hipotônica, flexão cervical e queda posterior da língua), o uso de BVM pode ser preferível. A BVM permite manipulação cefálica e cervical para manter a abertura da via aérea e adequada adaptação da interface máscara-face com as manobras jaw-thrust ou chin-lift e a cânula orofaríngea (cânula de Guedel).
Em pacientes adequadamente pré-oxigenados, o tempo estimado para dessaturação abaixo de 90% está resumido na figura 2, sendo dependente de fatores como idade, peso e doenças crônicas.
O que é e como fazer oxigenação apneica?
A oxigenação apneica consiste na administração passiva de oxigênio durante o período de apneia (paralisia) do paciente. A forma padrão de se manter a oxigenação apneica é por meio de cateter nasal com 15 L/min após a indução (sedação) e durante o processo de intubação.
Em centro cirúrgico, é bem estabelecido que esta técnica aumenta o tempo de apneia segura sem dessaturação. Apesar de estudos conflitantes fora do centro cirúrgico, uma meta-análise de 2017 com pacientes críticos em intubação de emergência também encontrou benefício em estender o tempo de apneia segura [8].
Por ser um técnica simples, com potencial benefício e sem riscos evidentes, recomenda-se seu uso em toda intubação de emergência.
Outras estratégias para otimizar o tempo de apneia segura
O uso da cabeceira da cama elevada de 20º a 25º pode auxiliar no aumento da apneia segura. Estudos em centros cirúrgicos evidenciam um incremento de até um minuto do tempo de apneia segura, apesar de um ensaio clínico em doentes críticos não ter encontrado benefício [9, 10].
A ventilação manual com BVM durante o período de indução até o início da laringoscopia pode ser realizada em pacientes com alto risco de dessaturação e baixo risco de aspiração. O principal estudo que avaliou essa conduta foi o PreVent, que observou redução do risco de hipoxemia durante o procedimento com o uso de ventilação manual na indução [11]. Alguns cuidados vistos no estudo devem ser tomados:
- Pacientes de alto risco de aspiração foram excluídos (vômitos, hematêmese, hemoptise e grávidas).
- BVM com ventilação manual suficiente apenas para expansão torácica visível.
- Uso de válvula de PEEP ajustada para 5 a 10 cmH2O.
- Sem hiperventilação, com frequências de no máximo 10 incursões por minuto.
O cateter nasal de alto fluxo (CNAF) tem sido cada vez mais usado na UTI e também estudado na pré-oxigenação e oxigenação apneica. Na pré-oxigenação, o CNAF parece ser equivalente à BVM e MNR, sendo usados fluxos de 50 a 60 L/min com FiO2 de 100% [12-14]. O CNAF pode ser mantido durante a tentativa de intubação, o que pode otimizar o tempo de apneia segura.
No estudo de abril de 2023 do Annals of Intensive Care realizado em pacientes cirúrgicos, o uso de máscara durante a pré-oxigenação foi comparado com o uso de máscara associado ao CNAF, mantendo-se o CNAF durante o período de apneia. O grupo submetido ao uso de CNAF teve menor risco de dessaturação quando comparado ao uso isolado da máscara [1].
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