Tirofiban no AVC isquêmico
Terapias de reperfusão para AVC isquêmico são o padrão ouro de tratamento agudo. A trombectomia mecânica é efetiva em casos com oclusão proximal de vasos, mas ainda pouco disponível. A trombólise endovenosa é mais acessível, porém é limitada pela janela terapêutica. O estudo RESCUE BT2, publicado no New England Journal of Medicine em junho de 2023, avaliou o papel do antiagregante tirofiban no tratamento agudo de AVC isquêmico sem oclusão proximal e sem resposta à trombólise endovenosa [1]. Esse tópico revisa os antiagregantes no AVC e traz os resultados do estudo.
Qual o papel da antiagregação no AVC?
A antiagregação é uma etapa importante para redução da taxa de recorrência do AVC.
Pacientes submetidos à trombólise endovenosa não devem iniciar antiagregação simples com ácido acetil salicílico (AAS) 100 mg/dia nas primeiras 24 horas por maior risco de sangramento intracraniano.
Pacientes submetidos à trombectomia não devem receber antiagregantes periprocedimento por risco de sangramento e piores desfechos. A utilização de antiagregantes após trombectomia depende de múltiplos fatores (colocação de stent, embolização distal do trombo) e a decisão deve ser tomada em conjunto com a equipe de neurorradiologia.
Pacientes que não realizaram terapia de reperfusão aguda devem ter antiagregação com AAS 100 mg/dia iniciada dentro das primeiras 24h. No AIT de baixo risco, a antiagregação com AAS 100 mg/dia deve ser iniciada dentro de 24 horas. Para revisar a abordagem ao AIT, confira o tópico Abordagem do Paciente com Ataque Isquêmico Transitório.
Pacientes com mecanismo cardioembólico evidente descoberto durante a investigação devem ter sua profilaxia secundária realizada com anticoagulação (veja também o tópico Quando Iniciar Anticoagulação de Fibrilação Atrial Após AVC?)
Quando pensar em dupla antiagregação para AVC?
Alguns pacientes não têm indicação de terapia de reperfusão e possuem menor risco de sangramento intracraniano. Esse grupo se beneficia de dupla antiagregação (DAPT) para minimizar o risco de recorrência.
Os pacientes que têm indicação de DAPT foram estabelecidos pelos principais estudos sobre o tema como o POINT e CHANCE, compilados em uma meta-análise [2]. As indicações são:
- AIT de alto risco, definido pelo escore ABCD2 de 4 ou mais.
- AVC com pontuação na escala de NIHSS de 3 ou menos.
Esses pacientes devem receber DAPT nas primeiras 24h. A prescrição deve ser realizada da seguinte maneira: dose inicial de ataque com AAS 300 mg e clopidogrel 300 mg, seguida de dose manutenção com AAS 100 mg/d e clopidogrel 75 mg/d.
A duração da DAPT deve ser de 21 dias, com suspensão do clopidogrel e manutenção de AAS isoladamente após esse período. Uma exceção a essa regra é para pacientes com evento cerebrovascular causado por aterosclerose intracraniana significativa (>70%). Nessa situação, estende-se a duração da DAPT para 90 dias.
O que o estudo acrescenta?
O tirofiban é um antiagregante que inibe a glicoproteína IIb/IIIa, uma das vias de ativação plaquetária. Esse mecanismo é distinto dos antiagregantes como AAS (inibidores da ciclo-oxigenase) e clopidogrel (inibidores da P2Y12). O tirofiban é administrado via endovenosa e tem meia vida curta, com efeito totalmente revertido até 3h do final da infusão aproximadamente.
O estudo RESCUE-BT2 foi duplo cego, multicêntrico em hospitais na China, randomizando 1177 pacientes em dois grupos. Um deles recebeu tirofiban endovenoso com placebo via oral, enquanto o outro recebeu AAS 100 mg com placebo endovenoso por 48h. Após o período inicial de 48h, ambos os grupos receberam AAS 100 mg até o 90º dia.
O estudo avaliou pacientes com AVC não cardioembólico com pontuação na escala de NIHSS de 5 ou mais e pertencentes a qualquer um dos grupos da tabela 1. O desfecho primário foi a avaliação de funcionalidade em 90 dias por meio da escala de Rankin modificada (mRS).
O resultado do estudo foi de melhores desfechos para o grupo tratado com tirofiban. O benefício foi melhor observado em desfechos secundários como avaliação de funcionalidade e qualidade de vida.
No grupo controle não houve sangramentos intracranianos sintomáticos, enquanto no grupo tratado com tirofiban houve seis eventos. Esse é um elemento importante a ser observado, mas a incidência ainda é considerada baixa (1%).
O estudo traz uma evidência mais robusta para um possível uso do tirofiban no AVC agudo em cenários com poucas opções terapêuticas.
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