Diretriz de Insuficiência Cardíaca AHA 2022
Em primeiro de abril foi divulgada a nova diretriz de Insuficiência Cardíaca (IC) da American Heart Association (AHA) [1]. O documento consolida várias descobertas recentes e traz nova ótica sobre pontos antigos. Aqui vão quatro tópicos de destaque do documento:
Novas terminologias
A AHA modificou a maneira da classificação dos estágios do paciente com IC. O que antes era dividido em letras de A a D, agora ficou mais descritivo e claro.
- Estágio A virou "Em risco para IC". Engloba pacientes que não possuem sintomas nem doença estrutural, mas tem comorbidades que precisam ser controladas como obesidade, hipertensão e exposição a agentes cardiotóxicos.
- Estágio B virou "Pré-IC". Pacientes assintomáticos, mas já com doença estrutural ou pressões cardíacas aumentadas (seja no ecocardiograma ou com BNP elevado). Se houver fração de ejeção reduzida (<40%), já existe benefício de inibidores da enzima conversora de angiotensina (iECA), mesmo sem sintomas. O betabloqueador também é uma opção, contanto que tenha história prévia de infarto agudo do miocárdio.
- Estágio C virou "IC sintomática".
- Estágio D virou "IC avançada".
Amiloidose
Outro ponto de destaque é o diagnóstico de amiloidose cardíaca. É recomendado fazer rastreio de amiloidose em pacientes com IC que possuem espessamento da parede do ventrículo esquerdo acima de 14 mm, principalmente quando o ECG não refletir esse espessamento (baixa amplitude no QRS). Outros indicadores são pacientes com estenose aórtica, síndrome do túnel do carpo, IC de fração de ejeção preservada (ICFEp), estenose do canal medular ou polineuropatia sensorial ou autonômica.
O rastreio é feito com pesquisa de cadeias leves monoclonais no sangue e na urina. Se esses exames forem negativos, mas a suspeita for alta, é possível ainda realizar a cintilografia cardíaca com pirofosfato de tecnécio. Esse último exame é relevante para o subtipo ATTR da amiloidose cardíaca, pois essa condição não produz cadeias leves. O diagnóstico impacta no aconselhamento genético do paciente e familiares e no tratamento, já que para o subtipo ATTR há evidência de redução de mortalidade com a medicação tafamidis.
Terapia da IC com fração de ejeção reduzida (ICFEr)
O documento elenca quatro terapias iniciais para o tratamento da IC de fração de ejeção reduzida, colocando-as em pé de igualdade:
- Inibidores da enzima conversora de angiotensina (iECA), bloqueadores do receptor da angiotensina 2 (BRA) e inibidores da neprilisina e receptor da angiotensina (ARNI) - Os ARNI agora são recomendados desde o início do tratamento em pacientes com IC sintomática NYHA 2 a 3. Já os iECA e BRA continuam recomendados em pacientes sintomáticos NYHA 2 a 4.
- Betabloqueador (BB) - Lembrando que os BB que reduzem mortalidade são carvedilol, succinato de metoprolol e bisoprolol.
- Inibidores do cotransportador de sódio glicose 2 (iSGLT2) - Independente se o paciente tem ou não diabetes.
- Antagonistas do receptor da aldosterona - Atenção com pacientes com taxa de filtração glomerular abaixo, de 30 ml/min e potássio acima de 5,5.
Inibidores do cotransportador de sódio glicose 2
Após o destaque que os iSGLT2 receberam nos periódicos nos últimos anos, a diretriz aumentou a sua importância. As recomendações para uso são:
- ICFEr: nível de evidência 1A, podendo ser introduzidos desde o começo do tratamento.
- IC com fração de ejeção levemente reduzida (40 a 50%): nível de evidência 2A.
- ICFEp: nível de evidência 2A.
Essas recomendações foram feitas baseadas em estudos como o EMPEROR-Preserved [2], que recebeu nossa premiação de artigo do ano de 2021 - Veja nosso resumo do artigo neste link.
Lembrando que não importa se o paciente tem ou não diabetes!
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