PrEP e PEP - Profilaxia Medicamentosa para Infecções Sexualmente Transmissíveis

Criado em: 06 de Novembro de 2023 Autor: Frederico Amorim Marcelino

Este tópico foi atualizado. Acesse "Atualização sobre Profilaxia Pré-exposição (PrEP) Semestral para HIV" para ver as novidades.

Profilaxia pré-exposição (PrEP) e profilaxia pós exposição (PEP) são estratégias de prevenção de infecção pelo HIV recomendadas pelo Ministério da Saúde. Em agosto de 2023, a United States Preventive Service Task Force (USPSTF) publicou uma revisão sistemática sobre PREP para HIV. Em abril de 2023, um estudo de PEP para infecções bacterianas sexualmente transmissíveis foi publicado no New England Journal of Medicine (NEJM) [1, 2]. Este tópico discute esses dois conceitos.

O que é PrEP para HIV

A profilaxia pré-exposição (PrEP) para HIV é feita com uso de antivirais. Existem duas formas principais de PrEP:

  • PrEP contínua: uso de antivirais diariamente, independentemente de frequência de relações sexuais.
  • PrEP sob demanda: uso de antivirais antes de uma exposição sexual, mantendo a medicação por um curto período após a relação.

Os principais esquemas estudados de PrEP são:

  • Tenofovir alafenamida (TAF) e entricitabina (FTC)
  • Tenofovir desoproxila (TDF) e entricitabina (FTC)
  • Tenofovir desoproxila (TDF) em monoterapia
  • Cabotegravir em monoterapia

O principal esquema usado no Brasil e disponibilizado no SUS é o comprimido coformulado de tenofovir e entricitabina, que atuam na transcriptase reversa. O cabotegravir atua na integrase e é de administração injetável. A medicação já foi aprovada pela ANVISA e aguarda avaliação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (CONITEC) para possível incorporação no SUS.

A evidência para o uso da PrEP foi revisada na atualização e revisão sistemática da USPSTF publicada no Journal of the American Medical Association [1]. Foram selecionados 32 estudos, sendo 20 randomizados e controlados. O uso de PrEP foi associado a diminuição do número de infecções por HIV com uma redução relativa do risco em 54%. A eficácia foi relacionada à aderência - em pacientes com aderência maior do que 70%, a redução relativa do risco foi de 73%.

A PrEP foi estudada e se mostrou efetiva em grupos com maior risco para infecção por HIV, incluindo:

  • Casais heterossexuais sorodiscordantes [3, 4]
  • Homens que fazem sexo com homens [5, 6, 7, 8]
  • Mulheres trans [9]
  • Usuários de droga injetável [10]

Com relação a efeitos colaterais, o tenofovir desoproxila pode causar nefrotoxicidade tubular e alteração da densidade mineral óssea. Em pacientes que usaram PrEP oral houve aumento de creatinina e mais episódios de náusea. Não houve diferença em eventos adversos graves ou aumento de infecções sexualmente transmissíveis (IST) em pacientes que usaram PrEP.

Como prescrever PrEP no Brasil

Cuidados antes da prescrição

Antes de iniciar a PrEP deve-se excluir a infecção pelo HIV. Recomenda-se realizar teste rápido anti-HIV em sangue total, soro ou plasma. Testes rápidos que usam fluido oral são contraindicados devido a baixa sensibilidade. Para pacientes com quadro suspeito de infecção aguda, a carga viral por reação em cadeia da polimerase (PCR) pode ser solicitada.

A profilaxia pós-exposição (PEP) deve ser oferecida no lugar da PrEP em pacientes que tiveram exposição de risco ao HIV nas últimas 72 horas. Após o período de 28 dias de uso de PEP, o paciente que não se infectou e mantém risco de infecção, tem indicação de usar PrEP.

Escolha da PrEP e prescrição

No Brasil estão disponíveis a PrEP oral contínua e a PrEP sob demanda. O Ministério da Saúde recomenda a prescrição de PrEP contínua para pacientes a partir de 15 anos, com mais de 35 kg de peso corporal que apresentem risco aumentado de infecção pelo HIV [11]. Não há definição consensual para o "risco aumentado de infecção pelo HIV". O fluxograma 1 demonstra uma sugestão para a tomada de decisão.

Fluxograma 1
Avaliação de indicação de PrEP em adultos sexualmente ativos
Avaliação de indicação de PrEP em adultos sexualmente ativos

A PrEP contínua disponível no Brasil via SUS é com TDF 300 mg e FTC 200 mg em comprimido coformulado. Recomenda-se uma dose inicial de dois comprimidos no primeiro dia. A dose de manutenção é de um comprimido ao dia.

As indicações de PrEP sob demanda são mais restritas (tabela 1). O esquema recomendado é de TDF 300 mg e FTC 200mg em comprimido coformulado. A dose é de dois comprimidos duas a 24 horas antes da relação sexual, um comprimido 24 horas após a dose inicial e um comprimido 48 horas após a primeira dose.

Tabela 1
Público alvo de profilaxia pré-exposição (PrEP) sob demanda
Público alvo de profilaxia pré-exposição (PrEP) sob demanda

No âmbito da saúde privada, a prescrição deve ser feita por profissional médico. Já no SUS a prescrição pode ser realizada por médico, farmacêutico ou enfermeiro. Devem ser preenchidos os formulários de cadastro do paciente via SUS e de prescrição da PrEP, entregues em conjunto com uma receita simples com o esquema recomendado.

A medicação é disponibilizada inicialmente por 30 dias até o primeiro retorno. Nessa consulta é repetido o exame de HIV e caso o paciente tenha aderido ao tratamento é feita uma nova prescrição para até quatro meses. Assim, os retornos subsequentes são a cada quatro meses. O paciente deve ser orientado que níveis protetores da medicação são alcançados na mucosa anal após sete dias do início da medicação e na mucosa vaginal após 20 dias do início da medicação. Durante esse período, o paciente deve receber orientação de outros métodos de profilaxia.

Avaliação clínica adicional

Tabela 2
Seguimento de usuários de profilaxia pré-exposição (PrEP)
Seguimento de usuários de profilaxia pré-exposição (PrEP)

A avaliação de função renal é recomendada para todos os pacientes candidatos à PrEP. Devido ao potencial de nefrotoxicidade do tenofovir, a PrEP é contraindicada em pacientes com clearance de creatinina < 60mL/min. Em pacientes já em uso de PrEP é recomendada a reavaliação da função renal a cada 12 meses. Em pacientes com maior risco de disfunção renal é recomendada avaliação a cada seis meses. O acompanhamento clínico e laboratorial da PrEP está detalhado na tabela 2.

PEP bacteriana e o estudo DoxyPEP

A PEP é o uso de medicações para prevenir infecção após eventos com possibilidade de transmissão. No contexto de IST, pode ser feita para evitar infecções virais (HIV e hepatite B) e bacterianas (gonorreia, clamídia e sífilis).

A PEP para HIV é indicada em pacientes que tiveram exposição de risco (tabela 3) nas últimas 72 horas, preferencialmente nas últimas 24 horas. O esquema prescrito é tenofovir 300 mg e lamivudina 300 mg em comprimido coformulado associados a dolutegravir 50 mg. É recomendada dose única diária por 28 dias [12].

Tabela 3
Risco de transmissão de HIV
Risco de transmissão de HIV

A PEP bacteriana com doxiciclina foi avaliada pelo DoxyPEP, um estudo randomizado, não cego, publicado em abril de 2023 no New England Journal of Medicine [2].

A amostra incluiu 501 participantes, sendo homens que fazem sexo com homens e mulheres trans em uso de PrEP para HIV ou vivendo com HIV. Os pacientes foram randomizados para receber doxiciclina 200 mg dentro de 72 horas após uma relação sexual sem preservativo ou tratamento padrão (aconselhamento, rastreio e tratamento se indicado). O desfecho primário foi o diagnóstico de pelo menos uma IST bacteriana (gonorreia, clamídia ou sífilis) em avaliação laboratorial realizada a cada três meses.

Nos pacientes vivendo com HIV, ISTs foram diagnosticadas em 11,8% do grupo doxiciclina e em 30,5% do grupo padrão. Já nos pacientes em uso de PrEP para HIV, uma IST foi diagnosticada em 10,7% dos pacientes do grupo doxiciclina e em 31,9% do grupo padrão. Houve redução da incidência das três IST - gonorreia, clamídia e sífilis.

Existe uma preocupação quanto ao desenvolvimento de resistência com o uso de PrEP e PEP. Culturas de uma parcela dos pacientes do estudo DoxyPEP identificaram maior resistência a tetraciclinas no grupo que usou doxiciclina. Também há um receio de aumento de resistência à ceftriaxona com o uso de doxicilina [13]. Estudos avaliando os efeitos a longo prazo dessas intervenções podem solucionar essas dúvidas.

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