Tratamento Agudo de Enxaqueca
O tratamento agudo da enxaqueca envolve analgésicos e antieméticos, mas pode incluir também a dexametasona como prevenção à recorrência precoce de cefaleia. A dose ideal dexametasona nesse contexto é desconhecida. Buscando responder essa pergunta, foi publicado na Neurology em outubro de 2023 um estudo que procurou estabelecer se uma dose menor do que a habitual de dexametasona seria benéfica aos pacientes [1]. Este tópico revisa o tratamento agudo de enxaqueca e traz os resultados do estudo.
Tratamento agudo da crise de enxaqueca
Enxaqueca é a principal cefaleia primária que leva à procura de tratamento em departamentos de emergência. É caracterizada pelos critérios diagnósticos da 3ª Classificação Internacional das Cefaleias (ICHD-3) conforme tabela 1.
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O tratamento da crise de enxaqueca envolve tanto medidas não farmacológicas como farmacológicas. Algumas das medidas não farmacológicas estão listadas na tabela 2 e devem ser orientadas ao paciente como ferramenta adicional no controle das crises. Não há evidências suficientes para recomendar terapias como quiropraxia, acupuntura ou homeopatia.
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O tratamento farmacológico inclui medicações específicas para enxaqueca (tabela 3) e analgésicos comuns. Algumas drogas não têm ação analgésica em outras condições, como os bloqueadores dopaminérgicos clorpromazina e metoclopramida, mas especificamente para enxaqueca podem ajudar no tratamento agudo.
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Diante de tantas opções, uma estratégia é avaliar o padrão de crise apresentado e o histórico de crises do paciente. O método mais utilizado é o estratificado, onde adequamos o tratamento à intensidade da cefaleia do paciente.
A cefaleia pode ser classificada como leve, moderada ou intensa levando em consideração a limitação funcional do paciente. As cefaleias leves podem ser manejadas com anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) ou analgésicos simples. Nas crises moderadas a graves, os triptanos compõem a prescrição de primeira escolha em associação a analgésicos simples e AINES. Opioides não devem ser prescritos para enxaqueca, pois não têm eficácia e possuem perfil deletério de efeitos colaterais. Veja um resumo de opções de tratamento na tabela 4.
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Tratamento de enxaqueca em situações especiais
Gestantes
A gestação pode mudar o padrão de enxaqueca das pacientes. Até 80% das mulheres podem melhorar o padrão de enxaqueca até o fim do 2º trimestre [2]. AINEs são seguros nos dois primeiros trimestres, mas não devem ser utilizados no 3º trimestre, por risco de fechamento do canal arterial com consequências hemodinâmicas para a circulação fetal. As demais drogas também possuem riscos, a tabela 5 traz a categoria de risco do FDA de cada uma das drogas mais utilizadas.
Existe uma maior prevalência de cefaleias secundárias na gestação, principalmente às custas de doenças hipertensivas da gestação como pré-eclâmpsia. Assim, deve-se ter um baixo limiar para suspeição e investigação de cefaleias secundárias nessa população.
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Período perimenstrual
O período perimenstrual pode piorar as crises de enxaqueca, principalmente nos dois dias anteriores ao início do sangramento. Uma estratégia que pode ser utilizada para mulheres que apresentam esse padrão é a miniprofilaxia. Essa estratégia é aplicável para mulheres com um padrão recorrente e bem estabelecido de crises durante o período menstrual e consiste em utilizar AINE por cinco a sete dias, começando dois dias antes do dia previsto para o início do período menstrual.
Status migranoso
Definido como uma crise de enxaqueca com duração maior que 72 horas. Nesse cenário, além do tratamento habitual com analgésicos e AINE, os pacientes se beneficiam de bloqueadores dopaminérgicos como a clorpromazina. As evidências são maiores para o uso endovenoso de clorpromazina com monitorização em sala de emergência, mas há também a opção de uso oral. O uso de dexametasona também é recomendado para diminuir o risco de recorrência precoce da cefaleia.
O que o estudo acrescenta
O estudo foi um ensaio clínico randomizado, duplo-cego em dois departamentos de emergência em Nova Iorque [1]. A questão abordada era se havia diferença entre as doses de 4 mg e 16 mg de dexametasona intravenosa (IV) no tratamento agudo da crise de enxaqueca.
Foram randomizados 209 pacientes com critérios diagnósticos de enxaqueca pelo ICHD-3 (Internacional Classification of Headache Disorders) em dois grupos: dexametasona 4 mg IV e dexametasona 16 mg IV. Ambos os grupos receberam metoclopramida 10 mg IV.
Os pacientes eram em sua maioria mulheres e tinham cefaleia com intensidade moderada a grave. Foram incluídos pacientes com enxaqueca sem aura (60%) e com aura (40%), além de pacientes com status migranoso (duração da dor > 72h).
O desfecho primário foi a melhora sustentada da cefaleia por 48 horas. Isso foi definido como a diminuição da intensidade da dor para “sem dor” ou “leve” e manutenção desse nível de dor por 48 horas sem necessidade de novas medicações.
O desfecho primário foi atingido em 34% dos pacientes no grupo dexametasona 4 mg versus 41% no grupo dexametasona 16 mg, uma diferença que não teve significância estatística (diferença absoluta 7%, IC -6% a 20%). Não houve diferença também ao realizar análise por sexo ou por duração da cefaleia.
O estudo impacta a prática clínica, pois fornece uma boa evidência para utilização de menores doses de dexametasona no tratamento agudo da enxaqueca. Isso gera menos efeitos adversos e exposição desnecessária a corticoides, sem comprometer o benefício na taxa de recorrência.
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