Manejo Não Hormonal de Sintomas Vasomotores do Climatério e Fezolinetanto
Os sintomas vasomotores são comuns no climatério e impactam a qualidade de vida das mulheres. A terapia com reposição hormonal é a mais eficaz para o tratamento, mas os riscos e contraindicações podem limitar o uso. O fezolinetanto é um novo medicamento não hormonal que foi aprovado em 2023 para uso nos Estados Unidos, após a publicação de dois estudos de fase 3 [1, 2]. Este tópico aborda o tratamento não hormonal desse quadro e traz os resultados dos estudos da nova droga.
Como e quando tratar sintomas vasomotores do climatério?
Sintomas vasomotores (SVM) acontecem em 50 a 80% das mulheres na transição menopausal [3, 4]. As principais queixas são de ondas de calor e sudorese noturna.
Os SVM ocorrem por uma alteração da inervação das áreas hipotalâmicas responsáveis pela termorregulação. A queda dos níveis de estrogênio durante a transição menopausal aumenta a quantidade de receptores da neurocinina 3 nesta região. Desse modo, pequenas variações da temperatura corporal já deflagram mecanismos de dissipação do calor e os SVM característicos [5].
Os SVM podem impactar negativamente na qualidade de vida da mulher. Medidas comportamentais, como uso de roupas respiráveis e controle da temperatura ambiente são suficientes para aliviar a maior parte do desconforto [5]. Casos muito sintomáticos devem ser tratados com terapia específica. A reposição hormonal é a alternativa mais eficaz para o controle do quadro.
A reposição de estrogênios (via oral ou transdérmica) é a terapia mais eficaz para reduzir os sintomas vasomotores. Contudo, está associada a riscos relevantes e contraindicações comuns (ver subtópico seguinte). A reposição de estrogênios deve ser associada a reposição de progestagênio em pacientes com útero, para prevenção de hiperplasia e desenvolvimento de câncer de endométrio [6].
Riscos da terapia hormonal
Um dos maiores estudos sobre terapia hormonal em pacientes na perimenopausa foi conduzido pela Women's Health Initiative. Esse grupo de pesquisadores avaliou intervenções dietéticas e farmacológicas em mulheres na transição menopausal e impactos nas principais causas de morbimortalidade (como doença cardiovascular, incidência de câncer e fraturas por fragilidade) [7].
A intervenção com terapia hormonal combinada (estrogênio conjugado associado a medroxiprogesterona em mulheres com útero) foi interrompida precocemente, após dados de aumento do risco de câncer de mama [8]. O estudo com terapia estrogênica isolada (em mulheres histerectomizadas) também foi interrompido precocemente, pela tendência ao aumento do risco de AVC e eventos tromboembólicos desta intervenção [9]. Os achados contribuíram para um melhor entendimento da terapia hormonal neste grupo, enfatizando a necessidade de uma avaliação cuidadosa do risco-benefício.
As contraindicações absolutas à terapia hormonal estão descritas na tabela 1. O risco cardiovascular e o de câncer de mama também devem ser avaliados antes da prescrição de terapia hormonal.
A diretriz da Endocrine Society recomenda preferir a reposição transdérmica em mulheres com moderado risco cardiovascular [10]. Já em mulheres com alto risco cardiovascular ou alto risco de câncer de mama, as terapias não hormonais devem ser a primeira escolha. Uma calculadora do risco de câncer de mama pode ajudar a guiar a decisão terapêutica. Um risco de câncer de mama em 5 anos de 5% ou mais é considerado alto. Para uma discussão sobre risco cardiovascular, veja o tópico Semaglutida para Prevenção Cardiovascular Secundária.
Os riscos e as contraindicações à terapia hormonal motivaram a pesquisa de alternativas terapêuticas não hormonais.
Terapias não hormonais disponíveis
Medicamentos não hormonais são uma alternativa para as mulheres com contraindicações ou que recusam o uso da terapia hormonal.
Os inibidores seletivos da recaptação de serotonina e antidepressivos duais (que atuam sobre serotonina e norepinefrina) possuem boa evidência para o controle dos SVM. Paroxetina e venlafaxina são representantes dessas classes, respectivamente, e podem reduzir a frequência dos SVM em 40% a 65%. A resposta para SVM é rápida, ocorrendo ainda nas primeiras duas semanas de uso [6, 11].
Opções menos efetivas incluem clonidina e gabapentina. A tabela 2 resume as possibilidades não hormonais.
O que é o fezolinetanto?
O fezolinetanto foi desenvolvido para agir no mecanismo fisiopatológico dos SVM. É um antagonista dos receptores de neurocinina, não tendo ação sobre o eixo hormonal. Dois estudos publicados em 2023 avaliaram eficácia e segurança do medicamento [1, 2].
Os estudos SKYLIGHT 1 e 2 tiveram o mesmo desenho. Foram estudadas amostras de mulheres entre 40 e 65 anos com histórico de pelo menos sete episódios diários de SVM moderados a intensos. Os grupos foram randomizados entre placebo, fezolinetanto 30 mg ao dia ou fezolinetanto 45 mg ao dia.
Houve redução significativa da frequência e gravidade dos SVM com uso de fezolinetanto na 4ª e 12ª semanas de avaliação, com ambas as doses estudadas, em comparação ao placebo. Após esse período, as mulheres foram acompanhadas por 40 semanas adicionais. As pacientes do grupo intervenção mantiveram a dose em uso, mas as participantes do grupo placebo foram randomizadas para fezolinetanto 30 ou 45 mg. Houve manutenção do benefício de controle de SVM na análise em 52 semanas.
Os principais eventos adversos observados foram leves, como cefaleia, dor abdominal e artralgia. Havia preocupação quanto ao aumento de transaminases com o uso de fezolinetanto, demonstrada em estudo anterior [12]. Nos estudos SKYLIGHT 1 e 2, a incidência de alteração laboratorial foi pequena e transitória.
O fezolinetanto é uma opção promissora para o controle de SVM, especialmente em mulheres com contraindicação ou recusa ao uso de terapias hormonais. Em maio de 2023 houve liberação da Food and Drug Administration para o uso nos Estados Unidos. Novos medicamentos que atuam sobre os receptores de neurocinina também estão em estudo, como o elinzanetanto [13].
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