Hipomagnesemia
Hipomagnesemia é um distúrbio eletrolítico comum, podendo ocorrer em até 10% dos pacientes em enfermaria e 65% daqueles em terapia intensiva. Um estudo publicado em 2023 revisou estratégias de reposição intravenosa de magnésio [1]. Este tópico foca na avaliação e tratamento da hipomagnesemia e traz os resultados do estudo.
Quais as principais causas de hipomagnesemia?
Hipomagnesemia pode acontecer por perdas gastrointestinais ou renais, baixa ingesta ou por redistribuição do magnésio extracelular e intracelular (tabela 1). Exemplos de redistribuição são a síndrome da fome óssea e a síndrome de realimentação.
Em pacientes com diabetes tipo 1 ou 2, o principal mecanismo de hipomagnesemia é a excreção renal por diurese osmótica, mas defeitos tubulares também estão envolvidos. A baixa concentração de magnésio perpetua a resistência insulínica e pode piorar o controle glicêmico. Não há consenso sobre monitorização e reposição de magnésio em pacientes com diabetes [2].
Os principais diuréticos associados à hipomagnesemia são os de alça e os tiazídicos. Diuréticos de alça, como a furosemida, impedem a reabsorção de magnésio na alça de Henle. Os tiazídicos agem no túbulo contorcido distal e têm impacto menor na reabsorção de magnésio. A longo prazo, tiazídicos podem causar hiperaldosteronismo secundário e interações com metabolismo do cálcio que justificam a hipomagnesemia [3].
Os inibidores de bomba de prótons (IBP) estão relacionados a hipomagnesemia. Essa relação é mais relevante quando os IBP são utilizados em conjunto com diuréticos, já que nesse contexto os mecanismos compensatórios da regulação renal falham [4]. A vonoprazana também pode estar associada a hipomagnesemia [5]. Saiba mais sobre vonoprazana no tópico Vonoprazana para Helicobacter pylori.
Cálcio e potássio interagem com o magnésio. A hipercalcemia aumenta a excreção renal de magnésio, podendo contribuir com hipomagnesemia. Inversamente, a hipomagnesemia pode causar hipocalcemia, especialmente pela redução na produção de paratormônio, que depende do magnésio. A excreção renal de potássio e magnésio é complexa. A hipomagnesemia pode levar a hipopotassemia e vice-versa. Esses eletrólitos precisam ser avaliados em conjunto para uma melhor interpretação do quadro clínico.
Quando há hipocalcemia ou hipopotassemia associada a hipomagnesemia, o tratamento deve focar inicialmente em repor magnésio. Nenhum dos distúrbios é completamente corrigido sem essa etapa [3].
Quais os sinais e sintomas de hipomagnesemia?
A concentração de magnésio altera o limiar de estimulação dos neurônios e a condução das membranas dos miócitos. Por isso, os principais sintomas da hipomagnesemia são neurológicos e cardiovasculares (figura 1). [6]. No entanto, a deficiência de magnésio pode ser assintomática até 1,2 mg/dL.
Sintomas neurológicos incluem fasciculações e tremores. Tetania pode estar presente quando associada a hipocalcemia [3]. Outra manifestação neurológica de hipomagnesemia é o nistagmo vertical.
Níveis abaixo de 1,6 mg/dL podem causar arritmias. Torsades de pointes pode ocorrer, especialmente na presença de outros fatores que prolongam o intervalo QT, como clorpromazina, haloperidol, amiodarona ou azitromicina. Diante de torsades o tratamento é sulfato de magnésio intravenoso, mesmo sem hipomagnesemia, reforçando o papel do eletrólito na estabilização dos miócitos [7, 8].
Recomenda-se rastreio periódico da concentração de magnésio nos seguintes pacientes, mesmo assintomáticos:
- Uso de medicações associadas ao prolongamento do QT. Os níveis de magnésio e potássio devem ser mantidos acima de 2 mg/dL e 4 mg/dL, respectivamente [9].
- Pacientes internados por insuficiência cardíaca ou infarto agudo do miocárdio. A American Heart Association recomenda a dosagem periódica de magnésio nesses casos e monitorização cardíaca quando houver hipomagnesemia [7, 10]
- Etilismo crônico, uso de nutrição parenteral total, diarreia disabsortiva e tempo prolongado de uso de diuréticos (como na insuficiência cardíaca).
Como tratar hipomagnesemia?
A escolha entre reposição intravenosa ou oral depende da gravidade dos sintomas e da estabilidade clínica do paciente (tabela 2). A infusão intravenosa eleva os níveis séricos de magnésio rapidamente, mas uma parte significativa é perdida na urina. Após a infusão inicial, é necessário continuar com a reposição para manter os estoques. Não há consenso sobre o melhor regime de tratamento para manter os níveis adequados de magnésio [3].
A reposição oral em altas doses pode causar sintomas gastrointestinais e não ser tolerada em pacientes sintomáticos.
O tratamento pode ser difícil em pacientes em uso de diuréticos. A troca para diuréticos poupadores de potássio como amilorida pode ser tentada. Em pacientes com uso de diuréticos e IBP, pode-se trocar também a classe do protetor gástrico. Estudos sugerem que bloqueadores dos receptores H2 da histamina não estão associados a hipomagnesemia [4]. Nos casos de hipomagnesemia refratária, os inibidores de SGLT2 podem ser usados [11].
Veja mais sobre magnésio no tratamento de asma e doença pulmonar obstrutiva crônica no tópico Sulfato de Magnésio para Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica.
O que o estudo mostra sobre a reposição de magnésio?
O estudo publicado em 2023 no Journal of Hospital Medicine avaliou a correção da hipomagnesemia em uma coorte retrospectiva de pacientes internados por insuficiência cardíaca [1]. Reposições utilizando 2 g de sulfato de magnésio intravenoso pelo menos duas vezes ao dia mantinham a concentração de magnésio acima de 2 mg/dL.
Níveis mais altos de reposição, como 4 gramas ou mais, levaram a aumento rápido da concentração de magnésio, seguida por uma queda acentuada. Infusões lentas e alteração da função renal foram associadas à maior estabilidade sérica.
Considerando as incertezas sobre a reposição magnésio, este estudo acrescenta informações do comportamento do eletrólito em resposta às diferentes quantidades de reposição. A estratégia utilizada pode servir como um guia para o tratamento da hipomagnesemia.
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