Como Fazer

Extubação: Cuidados e Como Fazer

Criado em: 09 de Setembro de 2024 Autor: Kaue Malpighi

A falha de extubação possui uma incidência em torno de 15% e está associada a piores desfechos e aumento da mortalidade [1]. O tópico “Extubação: Cuidados e Como Fazer” revisa o processo de extubação, incluindo avaliação neurológica, proteção de via aérea, testes respiratórios e outros passos para um procedimento adequado.

Avaliação neurológica e de proteção de via aérea

Os seguintes parâmetros devem ser avaliados antes de conduzir a extubação de um paciente:

  • Nível neurológico e proteção de via aérea
  • Aptidão respiratória e testes de respiração espontânea (TRE) - veja a tabela 1.
  • Risco de estridor pós extubação e teste do cuff-leak
Tabela 1
Critérios para considerar desmame da ventilação mecânica.
Critérios para considerar desmame da ventilação mecânica.

Com relação ao momento de iniciar TRE e os métodos disponíveis, veja o tópico "Desmame de Ventilação Mecânica e Testes de Respiração Espontânea".

A retirada do tubo orotraqueal necessita que o paciente se mantenha acordado e obedeça  a comandos. Essa avaliação pode ser difícil na presença de doenças neurológicas, o que pode atrasar a extubação.

A escala de coma de Glasgow é frequentemente utilizada como parâmetro neurológico para extubação, porém a sua capacidade de predizer falha é ruim. Muitos pacientes com Glasgow menor ou igual a 8 podem ter extubação bem sucedida e atrasar o procedimento unicamente por esse fator pode aumentar o risco de pneumonia associada a ventilação e os custo da internação [2, 3]. Uma avaliação mais ponderada da proteção de via aérea deve incluir:

  • Capacidade de obedecer comandos
  • Pico de fluxo da tosse
  • Volume de secreção

Quatro tarefas podem ser avaliadas na capacidade de obedecer comandos: abrir os olhos, olhar para o examinador, apertar a mão e mostrar a língua. A execução desses comandos é um preditor de sucesso de extubação melhor que o Glasgow [4].

Para avaliar o manejo de secreções da via aérea, o paciente deve ter um reflexo de tosse adequado e um baixo volume de secreção. Um pico de fluxo de tosse menor que 60 L/min e um volume de secreção maior que 2,5 mL/hora estão associados a aumento do risco de falha [5].

A avaliação dos comandos, do reflexo de tosse e quantidade de volume de secreção deve ser feita conjuntamente. Nos casos em que os três parâmetros estão inadequados, a taxa de falha se aproxima de 100%, independente do sucesso nos testes de respiração espontânea [5].

Teste de respiração espontânea e suporte não invasivo após extubação

O paciente deve ter realizado um TRE satisfatório para avaliar a aptidão respiratória para extubação. Contudo, mesmo após um TRE bem-sucedido, deve-se sempre avaliar se existe alto risco para falha por insuficiência respiratória, já que a ventilação não invasiva (VNI) após a extubação pode reduzir a probabilidade de falha.

Os critérios de alto risco de insuficiência respiratória após extubação não são consensuais e as diretrizes mencionam doenças cardiopulmonares e outras doenças graves, sem especificá-las [6, 7]. Recomenda-se que pacientes considerados de alto risco recebam VNI preventiva logo após a extubação por um período de 48 horas para reduzir risco de falha. Os estudos que encontraram benefício com essa intervenção utilizaram os seguintes parâmetros como critério de inclusão [6, 8]:

  • Idade maior 65 anos ou;
  • Qualquer doença cardiovascular (fração de ejeção ≤ 45%, edema pulmonar prévio, cardiopatia isquêmica ou fibrilação atrial) ou;
  • Qualquer doença pulmonar (DPOC, síndromes de hipoventilação ou doença pulmonar restritiva) ou;
  • Obesidade [9]

Estudos que evidenciaram benefício da VNI neste cenário realizaram mais de 8 horas por dia com uma média de 22 horas de ventilação não invasiva em 48 horas [7, 10]. O cateter nasal de alto fluxo pode ser utilizado entre as sessões de VNI [7, 11].

Outra aplicação da VNI é a estratégia conhecida como "VNI facilitadora". Esta técnica envolve extubação e início imediato da VNI mesmo em pacientes que não passaram no TRE e ainda apresentam necessidade de pressões de suporte baixas (pressões entre 8 a 12 cmH₂O). Esta estratégia pode reduzir tempo de ventilação mecânica sem aumentar riscos e parece mais benéfica em pacientes com DPOC com desmame dificultado (48 a 72 horas de desmame) [12].

Risco de estridor pós extubação e teste do cuff-leak

Estridor após extubação pode ocorrer em até 10% dos pacientes. A causa mais comum é o edema de laringe e pregas vocais. Outras causas de menor frequência são lesão laríngea pela intubação, presença de secreção espessa e estenose de traqueia [13].

A ocorrência de estridor está associada a alguns fatores de risco vistos na tabela 2 [13-15].

Tabela 2
Fatores de risco para estridor após extubação.
Fatores de risco para estridor após extubação.

Em pacientes que apresentem estes fatores, deve-se realizar o teste do cuff leak (ou teste do vazamento do balonete) antes da extubação. O teste tem baixo valor preditivo positivo e deve ser utilizado apenas para o perfil de pacientes acima, para não atrasar o processo de extubação [16, 17].

O teste do cuff leak é feito ao desinsuflar o balonete do tubo traqueal, avaliando a passagem de ar com a ausculta da traqueia ou por meio da observação dos volumes na ventilação mecânica. Ao desinsuflar o balonete, espera-se que ocorra a ausculta da passagem de ar ou que a diferença entre o volume inspiratório e expiratório no ventilador seja maior que 110 mL (ou seja, o volume inspiratório aferido pelo ventilador é maior que o expiratório). Essa diferença de volumes indica a presença de um vazamento ao redor do balonete desinsuflado, sugerindo que existe espaço entre o tubo e a traqueia e a via aérea não está significativamente obstruída. Se não houver ausculta ou a diferença dos volumes for menor que 110 mL, o teste é positivo e há maior risco de estridor após a extubação [18, 19]. 

Em pacientes com cuff leak positivo, recomenda-se o uso de corticoide (metilprednisolona 40 mg) intravenoso 4 horas antes de programar a extubação. Não é recomendado repetir o teste após este período para fazer a extubação. Caso ocorra estridor após a extubação, há recomendação de realizar nova dose de corticoide e adrenalina em nebulização. Em caso de persistência, considerar reintubação. O uso da VNI nestes casos não é recomendado por estar associada a aumento de mortalidade, possivelmente por atrasar a intubação sem acrescentar benefício [14, 20].

O que mais avaliar e como preparar a extubação

Outros parâmetros devem ser avaliados antes da extubação, mas isoladamente não contraindicam o procedimento:

  • Uso de droga vasotiva - doses de noradrenalina acima de 0,1 mcg/kg/min, principalmente com sinais de choque, pode estar associada a aumento do risco de falha de extubação [21].
  • Jejum - deve ser reservado apenas para pacientes com alto risco de broncoaspiração. Um estudo do Lancet de 2023 encontrou não inferioridade de manutenção da dieta enteral contra jejum de 6 horas em relação ao risco de reintubação e pneumonia [22].

Veja um passo a passo da avaliação da extubação e condutas para pacientes de risco no fluxograma 1.

Fluxograma 1
Fluxograma para avaliação de extubação.
Fluxograma para avaliação de extubação.

No momento da extubação, material para suporte de oxigênio e ventilação não invasiva devem ser separados conforme a avaliação de risco. O decúbito do paciente deve ser elevado para mantê-lo sentado e a via aérea baixa e a cavidade oral deve ser aspirada. Em pacientes com risco de estridor, o teste do cuff leak pode ser realizado neste momento, se não foi realizado antes. As fixações do tubo orotraqueal são retiradas, solicita-se para o paciente inspirar profundamente e exalar ou tossir após. No momento da exalação, o balonete é desinsuflado e o tubo retirado em um único movimento. Veja um vídeo sobre os passos da extubação aqui

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