Gabapentinoides: Principais Usos e Novos Eventos Adversos
Evidências dos últimos anos identificaram riscos dos gabapentinoides anteriormente desconhecidos que devem ser considerados antes da prescrição. Os dois principais medicamentos da classe são a gabapentina e a pregabalina. O TdC Bulário revisa as indicações e eventos adversos dos gabapentinoides.
Os gabapentinoides e o tratamento de dor neuropática
Os dois principais gabapentinoides são a pregabalina e a gabapentina. São usadas principalmente no tratamento de síndromes álgicas como dor neuropática e fibromialgia. Apesar de vantagens teóricas farmacológicas da pregabalina, ambas têm indicações semelhantes [1]. A gabapentina possui custo menor e está disponível no SUS como medicamento especializado. A tabela 1 mostra as apresentações disponíveis no momento da publicação do texto.

Dor neuropática
Pregabalina e gabapentina são drogas de primeira linha para tratamento de dores neuropáticas, junto aos tricíclicos, duloxetina e venlafaxina, segundo a International Association for the Study of Pain (IASP) [2]. As melhores evidências são para tratamento de polineuropatia diabética e neuralgia pós herpética. O NNT (número necessário para tratar) dos gabapentinoides é de 6 a 9 para melhora relevante de dor, pior do que o da amitriptilina, de 3. O uso em pacientes com câncer é indicado a partir de evidências extrapoladas de outros cenários [2-6].
O uso para dor lombar crônica e dor por radiculopatia ciática é controverso[7, 8]. Pregabalina não reduziu significativamente a intensidade da dor na perna por radiculopatia, em ensaio clínico randomizado [9].
Para dores de etiologia neurológica central, como pós-AVC, lesões de medula e esclerose múltipla, a evidência é melhor para pregabalina do que gabapentina [10, 11, 12].
Para a neuralgia do trigêmeo, os gabapentinoides não são drogas de primeira linha e a recomendação é mais forte para a gabapentina do que pregabalina. [13, 14].
Fibromialgia
A diretriz de fibromialgia da European Alliance of Associations for Rheumatology (EULAR) de 2017 recomenda o uso de pregabalina como tratamento farmacológico para pacientes com fibromialgia e dor grave e/ou distúrbios do sono [15]. Amitriptilina, duloxetina, tramadol e ciclobenzaprina também são opções medicamentosas, mas o texto não especifica preferências entre medicamentos para o tratamento.
Revisão sistemática e meta-análise da Cochrane de 2016, com 8 estudos randomizados, encontrou redução de dor em pacientes com fibromialgia que usaram pregabalina. Dos pacientes que usaram a medicação, 22 a 24% apresentaram redução maior do que 50% da dor, comparado com 14% no grupo placebo [16].
Um ensaio clínico randomizado encontrou que concentrar 300 mg de pregabalina em uma tomada única noturna teve o mesmo efeito sobre a dor do que 150 mg a cada 12 horas, com potencial benefício em melhorar a adesão e reduzir efeitos colaterais [17].
O uso da gabapentina para fibromialgia não é consensual. Um estudo, considerado de baixa qualidade, demonstrou benefício sobre controle de dor [18, 19]. Apesar disso, o Consenso Brasileiro de Reumatologia reconhece a gabapentina como opção para tratamento de fibromialgia [20].
Pacientes com fibromialgia usam subdoses de pregabalina. Apenas um terço atinge a dose mínima indicada, o que pode estar relacionado a inércia terapêutica ou preocupação dos médicos e pacientes com efeitos colaterais [21, 22].
Outras indicações dos gabapentinoides
Epilepsia
Pregabalina e gabapentina podem ser utilizadas como medida adjuvante para epilepsias com crises focais. Pregabalina foi inferior a lamotrigina em monoterapia para pacientes com epilepsia com crises focais [23]. Em idosos com crises focais, a American Academy of Neurology sugere a gabapentina como opção [24]. Um estudo encontrou equivalência entre gabapentina, lamotrigina e carbamazepina no controle de epilepsia de início em idosos [25]. Por outro lado, o estudo SANAD, feito em pacientes jovens, na maioria com epilepsia focal, encontrou que gabapentina falhou mais no tratamento do que lamotrigina e levou mais tempo para remissão do que carbamazepina e lamotrigina [26].
Outras
Outras possíveis indicações para pregabalina e gabapentina são tosse crônica refratária indeterminada, síndrome das pernas inquietas com sintomas crônicos persistentes, soluços intratáveis, prurido crônico, transtornos de ansiedade e sintomas vasomotores da menopausa como fogachos [27-33].
Gabapentina também é indicada como medicamento de segunda linha para transtorno por uso de álcool, síndrome de abstinência por álcool e tremor essencial [34-37].
Para mais informações sobre o uso da gabapentina no transtorno por uso de álcool, veja a "Baclofeno para Transtorno por Uso de Álcool".

Indicações, comentários e doses para uso de gabapentina e pregabalina estão na tabela 2.
Riscos e efeitos colaterais dos gabapentinoides
Os efeitos colaterais comuns dos gabapentinoides são tontura, sonolência, ganho de peso e edema periférico. O NNH (número necessário para prejudicar) para tontura é de 3,7, para sonolência de 7,4, para ganho de peso de 18 e para edema periférico é de 19 [16].
Dentre os efeitos, o edema de membros inferiores é pouco reconhecido e pode levar a prescrição de diuréticos como tentativa de tratamento [38] Esse fenômeno é conhecido como cascata de prescrição e deve ser lembrado antes da prescrição em idosos.
Recentemente, novos estudos sugerem quatro novos eventos adversos: aumento do risco de exacerbações do DPOC, fraturas de fêmur, ideação suicida e dependência.
- DPOC: estudo publicado em 2024 no Annals of Internal Medicine, identificou que o uso de gabapentinoides, em pacientes com mais de 55 anos com suspeita de DPOC, esteve associado ao aumento de 39% no risco relativo de exacerbações graves. Também houve aumento do risco de exacerbações moderadas e insuficiência respiratória. O aumento do risco foi semelhante entre gabapentina e pregabalina e ocorreu independentemente de idade, sexo ou outros marcadores de gravidade de DPOC [39].
- Fratura de fêmur: estudo australiano de coorte publicado no JAMA, também em 2024, encontrou que a prescrição de gabapentinoides foi associada a aumento do risco de fratura de fêmur (OR, 1.30; IC 95%, 1.07-1.57). A maioria dos pacientes tinha mais de 80 anos. O aumento do risco foi mais elevado em pacientes com escores de fragilidade piores ou com doença renal crônica [40].
- Ideação suicida: estudo sueco encontrou associação entre o uso de gabapentinoides e ideação suicida, overdose não intencional, lesões corporais e acidentes de trânsito [41].
- Dependência: estudo do Reino Unido indicou que a prescrição de gabapentinoides aumentou em 24% por ano de 2004 a 2015 concomitantemente a um aumento no número de óbitos relacionados ao seu uso [42]. Estudo em departamento de emergência encontrou que 3% das overdoses por drogas envolviam gabapentinoides, a maioria por pregabalina [43]. As populações de maior risco são os mais jovens ou os com história de doença psiquiátrica [44].
Os gabapentinoides são medicações cada vez mais usadas de forma off-label [45]. A decisão de prescrever a medicação deve levar em consideração os novos potenciais eventos adversos e a segurança em comparação com outras medicações. Uma diretriz francesa de dor neuropática, por exemplo, rebaixou a pregabalina para segunda linha por considerar nortriptilina e duloxetina mais seguros [46, 47].
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