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Tromboembolismo Pulmonar

Criado em: 29 de Agosto de 2022 Autor: Joanne Alves Moreira

Em julho de 2022, o New England Journal of Medicine publicou uma revisão sobre tromboembolismo pulmonar (TEP) [1]. Baseado na votação dos assinantes, nessa revisão do mês vamos abordar tópicos relevantes sobre o tema.

Epidemiologia

A incidência mundial de TEP é de aproximadamente 1 para 1000 pessoas a cada ano. Quase 20% dos pacientes morrem em até 90 dias, mas o TEP não é comumente a causa de óbito . Isso ocorre já que frequentemente a doença tromboembólica coexiste com outras condições como neoplasia ou sepse. A recuperação é complicada por recorrências, sangramento por anticoagulantes, hipertensão pulmonar secundária e estresse psicológico.

Investigação inicial e escore PERC

O início agudo de sintomas cardiorrespiratórios é um indicativo conhecido de TEP, porém algumas situações podem enganar o avaliador. Síncope, especialmente no paciente internado, é uma manifestação descrita no TEP. Além disso, arritmias ou choque sem causa aparente também são apresentações importantes.

O aspecto mais desafiador no diagnóstico é saber qual exame requisitar uma vez que existe a suspeita de TEP. Nesse contexto, os testes não invasivos se baseiam na probabilidade pré-teste e são úteis para descartar o diagnóstico, levando a uma redução segura do uso da tomografia computadorizada (TC). Com algoritmos de avaliação validados, apenas 30 a 40% dos pacientes com suspeita de TEP são submetidos a avaliação por imagem.

Tabela 1
Escore PERC
Escore PERC

Nos casos em que é muito improvável que o paciente tenha embolia pulmonar (probabilidade estimada < 15%), estudos de coorte mostraram que o Pulmonary Embolism Rule-out Criteria (PERC) (veja a tabela 1) pode descartar com segurança a possibilidade de TEP, sem avaliação diagnóstica adicional [2]. Isso é possível quando nenhum dos itens do escore está presente (sensibilidade de 96% a 100% e especificidade de 27% a 15%). Assim, se o médico julgar que a probabilidade de TEP é baixa, pode aplicar o escore PERC e, se negativo, pode descartar a hipótese sem a necessidade de mais exames.

Escore de Genebra e Wells

Tabela 2
Critério de Wells para Tromboembolismo Pulmonar
Critério de Wells para Tromboembolismo Pulmonar

Quando a probabilidade não é tão baixa para aplicar o escore PERC, deve-se estimá-la por um dos três escores a seguir: Wells, Genebra revisado e Genebra simplificado. Uma pontuação ≤ 4 no escore Wells (veja a tabela 2), ≤ 10 no escore Genebra revisado e ≤ 4 no escore de Genebra simplificado (veja a tabela 3) configuram uma baixa probabilidade clínica. Quando a probabilidade é baixa por essas ferramentas, a hipótese de TEP pode ser excluída com segurança com base no valor de D-dímero seguindo os limites de corte recomendados pelo fabricante (sensibilidade 98 a 99% e especificidade de 37 a 40%).

Tabela 3
Escore de Genebra para Tromboembolismo Pulmonar
Escore de Genebra para Tromboembolismo Pulmonar

D-dímero

Apesar de que TEP pode ser excluído com D-dímero menor que 500 ng/ml em pacientes com baixa probabilidade, essa combinação de achados não é tão comum. Novas abordagens tentam ajustar o limiar do D-dímero, com o objetivo de reduzir os falsos positivos. Estas abordagens incluem níveis de D-dímero que são ajustados para a idade (sensibilidade de 97 a 99% e a especificidade de 42 a 47%), ao algoritmo YEARS (sensibilidade 96 a 98% e especificidade 54 a 61%) ou ao escore de Wells (sensibilidade 93 a 97%; especificidade, 61 a 67%). Faltam ensaios randomizados que comparem as estratégias de ajuste do D-dímero em pacientes com suspeita de TEP.

Tabela 4
Itens do YEARS
Itens do YEARS

O D-dímero é altamente sensível em pacientes hospitalizados. No entanto, é menos útil na exclusão de TEP, já que os níveis são frequentemente elevados durante uma intercorrência clínica ou após uma cirurgia.

Imagem

O diagnóstico por imagem é reservado para pacientes nos quais TEP não pode ser descartado com base nos escores de probabilidade clínica associados ou não ao D-dímero. A angiotomografia pulmonar (angioTC) é geralmente o exame de escolha. Para minimizar a irradiação em pacientes mais jovens, a TC de ventilação-perfusão com emissão de fótons (SPECT-CT) é uma opção de baixa radiação. A incidência de resultados falsos positivos na angioTC varia, mas pode chegar até 5%. O desempenho diagnóstico do SPECT-CT não foi bem estabelecido.

Fluxograma 1
Fluxograma de investigação de tromboembolismo pulmonar (TEP)
Fluxograma de investigação de tromboembolismo pulmonar (TEP)

Em situações em que há necessidade de evitar a radiação, como na gestação, a ultrassonografia de membros inferiores pode definir a conduta adequada. A cintilografia pulmonar de ventilação-perfusão é outro método diagnóstico disponível para esses casos, mas sua disponibilidade é menor.

Estratificação de risco

Após o diagnóstico, deve-se estratificar o risco do TEP em alto, intermediário e baixo risco. Essa estratificação é o ponto chave para guiar o tratamento inicial.

Alto risco - Aproximadamente 5% dos pacientes são admitidos com TEP de alto risco. Os achados clínicos que caracterizam essa apresentação são:

  • Choque
  • Hipoperfusão tecidual
  • Hipotensão (pressão arterial sistólica menor que 90 mmHg ou queda da pressão arterial sistólica em mais de 40 mmHg sem associação com sepse, arritmia ou hipovolemia)
  • Parada cardiorrespiratória

Risco intermediário - Essa categoria inclui os pacientes com evidências de disfunção de ventrículo direito no ecocardiograma ou angioTC, elevação de biomarcadores cardíacos (troponina ou BNP) ou ambos.

Risco baixo - Neste estrato encontram-se os pacientes com TEP sem alterações hemodinâmicas, sem disfunção ventricular direita e sem elevação de biomarcadores cardíacos.

Tratamento agudo do paciente de alto risco

Tabela 5
Contraindicações à trombólise
Contraindicações à trombólise

Nesse cenário há benefício de terapia de reperfusão imediata, exceto na presença de contraindicações (veja tabela 5). Os trombolíticos disponíveis para essa indicação são o tenecteplase e o alteplase. A dose do tenecteplase é definida conforme a faixa de peso. Em contraponto, o alteplase pode ser prescrito de duas formas: 0,6 mg/kg com infusão durante 15 min (dose máxima de 50 mg) ou 100 mg com infusão em 2h [2]. Os regimes com dose guiada por peso são preferíveis em idosos ou pacientes com baixo peso (veja os regimes na tabela 6).

Tabela 6
Trombolíticos e doses no tromboembolismo pulmonar
Trombolíticos e doses no tromboembolismo pulmonar

Quando há contraindicação à trombólise, as alternativas são embolectomia ou trombólise guiada por cateter com ou sem embolectomia, além de suporte hemodinâmico.

Tratamento agudo do risco intermediário

A trombólise não é rotineiramente recomendada para estes pacientes. Em um estudo randomizado que comparou a associação de tenecteplase à heparina versus placebo associado a heparina em pacientes de risco intermediário, o grupo intervenção teve uma redução absoluta do risco de descompensação hemodinâmica e morte de 3% [3]. No entanto, houve 9% de aumento no risco de sangramentos maiores e um aumento de 2% no risco de AVC hemorrágico. Assim, sugere-se que pacientes de intermediário risco devem ser monitorizados de perto para identificação precoce de deterioração clínica, situação em que a terapia de reperfusão poderá ser administrada.

A anticoagulação terapêutica está indicada e a revisão sugere utilizar de preferência a heparina de baixo peso molecular (HBPM). Não há evidências que compararam os efeitos terapêuticos imediatos da HBPM com os anticoagulantes orais diretos (DOACs) em pacientes com risco intermediário. A European Society of Cardiology (ESC) sugere que após 2 a 3 dias de anticoagulação plena com HBPM é possível converter para tratamento oral.

Quando disponível, trombólise guiada por cateter é uma opção para pacientes em risco intermediário que têm um trombo proximal. Não há provas suficientes para respaldar a superioridade desse tratamento em comparação com a HBPM neste grupo de pacientes.

Tratamento agudo do baixo risco

A maioria desses pacientes pode ser tratada com um DOAC e são elegíveis para tratamento ambulatorial quando há adequado suporte social e baixo risco de sangramento.

Tabela 7
PESI simplificado (Simplified Pulmonary Embolism Severity Index)
PESI simplificado (Simplified Pulmonary Embolism Severity Index)

A decisão para o tratamento ambulatorial é guiada pelo Pulmonary Embolism Severity Index (PESI) simplificado (tabela 7) ou pelo escore Hestia (tabela 8). O tratamento domiciliar é uma opção segura para algumas pessoas com TEP de baixo risco. Um ensaio randomizado mostrou um baixo risco de eventos adversos em pacientes que não preencheram critérios pelo escore Hestia ou que tiveram uma pontuação de 0 no PESI simplificado [4].

Tabela 8
Escore Hestia
Escore Hestia

Tratamento de manutenção

Os DOACs são opções de primeira linha no tratamento de manutenção. Um ensaio clínico encontrou que os DOACs, que não necessitam de monitoramento, são tão eficazes em reduzir o risco de tromboembolismo venoso recorrente quanto os antagonistas da vitamina K e resultam em um menor risco de sangramento maior [5].

Em pacientes com câncer, os ensaios clínicos respaldam a segurança e a eficácia dos DOACs (apixabana, edoxabana e rivaroxabana) como alternativa ao tratamento com HBPM. A escolha entre os DOACs disponíveis deve ser orientada pelo perfil farmacológico e pelas preferências do paciente.

Os antagonistas de vitamina K são preferidos em pacientes com doença renal crônica avançada, hepatopatia e em pacientes com síndrome antifosfolípide com títulos muito altos de anticorpos ou com histórico de trombose arterial. A HBPM é o tratamento de escolha em mulheres grávidas, pois as demais drogas atravessam a circulação placentária e podem trazer riscos ao feto.

Tempo de tratamento e seguimento

Pacientes com TEP agudo devem ser anticoagulados por pelo menos 3 meses para reduzir os riscos de novas embolizações, extensão do trombo, recorrência precoce de tromboembolismo venoso e morte. Após os 3 meses, a decisão de interromper ou continuar a anticoagulação depende do risco de recorrência de tromboembolismo venoso (TEV) e de sangramento, levando em conta a preferência do paciente. Caso a anticoagulação seja mantida, essa decisão deve ser reavaliada pelo menos anualmente. A anticoagulação pode precisar ser descontinuada se o risco de sangramento aumentar, se ocorrer um evento hemorrágico grave ou se o paciente preferir interromper o tratamento.

Tabela 9
Regimes de tratamento com anticoagulantes para TEP
Regimes de tratamento com anticoagulantes para TEP

A anticoagulação pode ser interrompida após 3 meses nos pacientes com baixo risco de recorrência a longo prazo. Nessa categoria se enquadram aqueles com TEP provocado por um fator de risco maior transitório ou reversível (cirurgia com anestesia geral com duração > 30 minutos, internação hospitalar por ≥ 3 dias devido a uma doença aguda, trauma ou fratura importante).

Nos casos de TEP associado a disfunção moderada do ventrículo direito, sintomas residuais persistentes ou TEP extenso, alguns especialistas recomendam que o tratamento se estenda até 6 meses [6].

Em pacientes com fatores de risco persistentes (como neoplasia ativa ou síndrome antifosfolípide) ou com episódios anteriores de TEV não provocado, o risco de recorrência a longo prazo é alto e recomenda-se a anticoagulação por tempo indefinido.

Apesar de reduzir a recorrência de TEV, manter a anticoagulação prolongada está associado a eventos hemorrágicos. O risco de sangramento é maior em pacientes com mais de 65 anos, taxa de filtração glomerular menor que 50 mL/minuto, histórico de sangramento, uso concomitante de antiplaquetários ou hemoglobina menor que 10 g/dL.

Embora a anticoagulação por tempo indefinido seja normalmente recomendada após um primeiro evento de TEV não provocado ou fracamente provocado, a suspensão do tratamento pode ser apropriada em alguns pacientes. Essa decisão pode ser orientada pela regra HERDOO2, um escore validado que identifica mulheres com um primeiro TEV não provocado ou fracamente provocado [7]. Mulheres com pontuação zero ou um podem descontinuar a anticoagulação com segurança. Não há escores validados para homens nesse cenário e muitos especialistas recomendam a continuação da anticoagulação por tempo indeterminado.

Em pacientes com anticoagulação indefinida, a dose do DOAC pode ser reduzida após 6 meses iniciais com dose plena. Dados de ensaios randomizados indicam que a redução de dose após 6 meses têm eficácia e segurança similares em relação a manter a dose habitual [8].

Em relação ao seguimento, existe a preocupação de o paciente ter um câncer oculto. Neoplasias são detectadas em 5.2% dos pacientes dentro de 1 ano após um diagnóstico de TEV não provocado [9]. Os especialistas recomendam rastreio de câncer guiado por história pessoal, exame físico, testes laboratoriais gerais, além de rastreios específicos para idade e sexo. Outros problemas que devem ser avaliados são o desenvolvimento de síndrome pós-TEP ou hipertensão pulmonar crônica secundária ao TEP. Os pacientes devem ser atendidos de 3 a 6 meses após o diagnóstico de TEP agudo para avaliação de sintomas como dispneia ou limitação funcional.

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