Desprescrição de inibidores de bomba de prótons

Criado em: 29 de Maio de 2022 Autor: Pedro Rafael Del Santo Magno

A Associação de Gastroenterologia Americana (AGA) publicou um documento em fevereiro de 2022 sobre a desprescrição de inibidores de bomba de prótons (IBP) [1]. Vamos ver quando e como fazer!

Porque isso é um problema?

A prevalência do uso de IBP tem aumentado progressivamente. Muitas vezes, esse é um medicamento que persiste sendo utilizado sem indicação. Estima-se que 25% dos pacientes que começam um IBP permanecem tomando por pelo menos um ano, apesar de o tempo recomendado de uso ser menor.

A facilidade de adquirir nas farmácias e o perfil aparentemente seguro dos IBP são possíveis explicações para o uso indiscriminado. As complicações do uso da medicação (como neoplasia gástrica, fratura, demência) derivam de estudos observacionais, dificultando o estabelecimento de uma causalidade clara.

Como não há benefício em tomar por tanto tempo, a única coisa que resta são os riscos, apesar de remotos. Sem contar os malefícios não biomédicos como polifarmácia e prejuízo financeiro.

Indicações do uso de IBP

A maioria das indicações do uso de IBP são para períodos curtos (menores que 8 semanas). Contudo, existem algumas indicações de uso de IBP por períodos prolongados, como:

  1. Complicações ou condições associadas à DRGE
    • Esofâgo de Barret e adenocarcinoma de esofâgo
    • Esofagite erosiva com classificação endoscópica de Los Angeles C e D
    • Complicações mecânicas de DRGE como estenose péptica
    • Retardar a progressão de fibrose pulmonar idiopática
  2. Esofagite Eosinofílica
  3. Risco de Sangramento Gastrointestinal
    • Síndrome de Zollinger-Ellison
    • Proteção gástrica para paciente que necessitam de AAS ou AINE mas com alto risco de sangramento gastrointestinal
Tabela 1
Recomendações para uso de IBPs
Recomendações para uso de IBPs

Pacientes com indicações de curtos períodos, mas que tiveram recorrência dos sintomas após interromper o IBP, também podem necessitar de períodos mais longos.Veja as recomendações na tabela 1.

O que vale marcar são as situações que NÃO possuem indicação para IBP. A principal é para sintomas persistentes na garganta, como: rouquidão, dor de garganta, tosse e sensação de engasgo. O trabalho TOPPITS, publicado no BMJ em 2021, randomizou 1427 pacientes com esses sintomas por mais de 6 semanas a tomarem IBP ou placebo [2]. Não houve diferença entre os grupos!

Dose dobrada

A dose dobrada de IBP (seja dois comprimidos pela manhã ou 1 comprimido duas vezes ao dia) não possui evidência para uso crônico. Só existem dois benefícios estabelecidos para esse uso:

  • Período agudo da hemorragia digestiva por úlcera péptica.
  • Síndrome de Zollinger-Ellison.

É razoável tentar uma dose maior de IBP em pacientes com sintomas refratários. Contudo, em um trabalho com pacientes com DRGE, 80% dos que utilizaram dose superior conseguem depois reduzir para doses habituais sem mudanças no sintomas. Vale a tentativa de desprescrever!

E como desprecrever?

O primeiro ponto é avisar que podem ocorrer sintomas de rebote na hora da retirada. Eles predominam nas primeiras 8 semanas, mas podem durar até 6 meses. Sintomáticos como antiácidos, antagonistas H2 e até mesmo doses eventuais de IBP são opções nesses casos. Quando os sintomas de rebote duram mais de 8 semanas, é válido considerar terapias mais longas ou até cirurgias gastrointestinais devido à refratariedade.

Reduzir de maneira gradual não teve diferença em relação a reduzir de maneira abrupta. A taxa de sintomas de rebote é a mesma. As duas estratégias podem ser utilizadas!

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