Reposição de Vitamina D
Em julho de 2022, um grande ensaio clínico randomizado sobre vitamina D e desfechos ósseos foi publicado no New England Journal of Medicine [1]. Vamos discutir sobre esse assunto que é alvo de uma das maiores polêmicas endocrinológicas da atualidade!
O que é a vitamina D?
A vitamina D é uma vitamina lipossolúvel que age estimulando a absorção de cálcio no intestino, a reabsorção óssea e inibindo a excreção renal de cálcio e fosfato. Poucos alimentos contêm vitamina D naturalmente (ex.: salmão, sardinha, cogumelos) e alguns produtos, como o leite, são fortificados com a vitamina.
A principal fonte da substância é a síntese na pele. Em seguida, a vitamina é metabolizada no fígado em 25-hidroxi-vitamina D (25-OH) e convertida no rim para 1,25 dihidroxivitamina D, a forma ativa. Fosfato baixo e hormônio paratireoidiano (PTH) alto aumentam a conversão na forma ativa.
A recomendação dietética é baseada nos potenciais benefícios na saúde óssea. Não existe consenso sobre a meta a ser atingida. De acordo com o Institute of Medicine, 600 a 800 unidades internacionais (UI) por dia seriam suficientes para a maior parte da população [2]. Essa meta seria equivalente a níveis séricos maiores que 20 ng/mL de 25-OH Vitamina D. Para idosos, a International Osteoporosis Foundation e a Sociedade Americana de Endocrinologia sugerem níveis de, no mínimo, 30 ng/mL [3, 4]. O limite superior de segurança seria de até 4000 UI por dia.
O que já foi estudado sobre seus efeitos?
O VITAL, um grande ensaio clínico randomizado do Brigham and Women's Hospital, foi desenhado para avaliar os efeitos da suplementação de vitamina D e Ômega 3 sobre câncer e doenças cardiovasculares. Publicado em 2019, não houve diminuição dessas doenças com a suplementação da vitamina D [5].
De lá pra cá, muitos estudos auxiliares utilizaram a população do VITAL para avaliação de outros desfechos. Um resultado positivo foi a redução da incidência de artrite reumatoide e polimialgia reumática [5]. Por outro lado, os seguintes desfechos não foram melhorados com a suplementação da vitamina:
Vitamina D e fraturas
Até hoje, os principais ensaios que testaram drogas para osteoporose, como os bisfosfonatos, utilizaram cálcio e vitamina D tanto no grupo placebo, quanto no intervenção. Há dúvida se de fato a vitamina D tem papel na redução da incidência de fraturas e na melhora da densidade mineral óssea. Alguns estudos observacionais, indicaram haver relação entre baixos níveis de vitamina D e menor densidade mineral óssea [14, 15]. Apesar disso, é sabido que doses altas (500.000 UI, uma vez por ano) aumentam, paradoxalmente, o risco de fraturas [16].
Esse trabalho publicado no New England Journal of Medicine (NEJM) agora em julho foi um estudo auxiliar do ensaio VITAL. O objetivo foi avaliar os efeitos da suplementação de vitamina D na incidência de fraturas em homens e mulheres com mais de 50 anos. A dose utilizada foi de 2000 UI de vitamina D por dia. Os desfechos primários foram as incidências totais de fraturas, fraturas não vertebrais e fraturas de quadril. Mais de 25 mil pacientes foram acompanhados em média por 5 anos, em uma análise por intenção de tratar.
Em comparação com o placebo, a suplementação de vitamina D não teve efeito na incidência de fraturas. Esse resultado se manteve independentemente de idade, sexo, raça, índice de massa corpórea (IMC) e mesmo após ajuste para diversas faixas de níveis séricos de vitamina D.
Como esse trabalho modifica nossa prática?
Os estudos provenientes do VITAL mostraram que a suplementação de vitamina D não tem benefícios importantes na saúde da população geral de adultos com mais de 50 anos, mesmo em pacientes com níveis iniciais muito baixos. O editorial do NEJM é taxativo ao afirmar que os termos insuficiência e deficiência de vitamina D devem ser reconsiderados e que não há justificativa tanto para mensuração de 25-OH vitamina D e rastreio, na população geral, quanto para suplementação objetivando atingir um alvo sérico. Já que os pacientes não foram selecionados com base nos níveis de vitamina D, osteoporose ou baixa densidade mineral óssea, esses resultados não podem ser generalizados para pacientes adultos com osteoporose. Apesar disso, esse estudo não encontrou benefícios na incidência de fraturas mesmo nos grupos de alto risco, como os que tratavam osteoporose ou os que já haviam tido fraturas de fragilidade. Esses resultados são exploratórios e podem servir como base para novos estudos que avaliem essas populações especificamente. Também não é possível afirmar se a coadministração de cálcio poderia levar a melhores resultados do que os encontrados. Novos estudos a partir do VITAL estão tentando identificar se há alguma população em especial que se beneficiaria da suplementação.