Fentanil na Intubação de Sequência Rápida
O papel do fentanil na intubação de sequência rápida é motivo de debate. Será que é benéfico utilizar essa droga antes das outras medicações? Esse tópico revisa as evidências sobre o tema.
Fentanil e intubação de sequência rápida
Intubação de sequência rápida (ISR) é a administração praticamente simultânea de um sedativo e um bloqueador neuromuscular para rapidamente induzir inconsciência e paralisia e assim facilitar uma intubação orotraqueal (IOT) rápida.
Essa técnica minimiza o tempo de apneia, já que o paciente estará nas condições ideais para laringoscopia rapidamente. Isso permite que ele seja apenas oxigenado, mas não ventilado ativamente. Essa vantagem é interessante na IOT de emergência já que todos os pacientes a princípio tem o estômago cheio e a ventilação aumentaria o risco de aspiração.
A manipulação da via aérea causa respostas fisiológicas que podem ser danosas em alguns pacientes. A pressão arterial e intracraniana se elevam [1, 2]. Para atenuar essas respostas, algumas medicações podem ser usadas como pré-tratamento, antes do sedativo e do bloqueador.
É no pré-tratamento que o fentanil pode ser utilizado, com a ideia de amenizar a elevação da pressão arterial e intracraniana. Isso seria benéfico em pacientes com hipertensão intracraniana ou com condições que pioram com elevações da pressão, como infarto agudo do miocárdio, dissecção de aorta e edema agudo de pulmão.
Fentanil na intubação: evidências
O fentanil é capaz de atenuar a elevação de pressão arterial e frequência cardíaca na ISR segundo alguns estudos [3, 4]. Os estudos que avaliaram esses efeitos do fentanil são mais antigos, datando de 1990 e 1980, alguns com doses da droga maiores das atuais. Alguns estudos contemporâneos não repetiram os achados de estudos passados com o fentanil [5, 6]. Aprimoramentos na prática médica e drogas novas podem explicar essas mudanças. Nossa revisão não encontrou estudos com fentanil mostrando benefício em desfechos clínicos (mortalidade, tempo de internação, funcionalidade e outros).
O fentanil é o opióide de escolha nesse cenário por seu início de ação rápido, duração curta e ausência de liberação de histamina. Outro argumento a favor é reduzir a dor durante o procedimento, apesar de não existirem dados claros indicando que a IOT necessita de analgesia. Não há estudos com memória de dor na IOT, mesmo no centro cirúrgico. A quetamina, agente sedativo, também pode fornecer analgesia. A videolaringoscopia exige menos força e pode tornar o procedimento menos doloroso (veja o tópico sobre videolaringoscopia).
O fentanil pode causar eventos adversos nos pacientes submetidos a RSI, sendo o maior deles a hipotensão [7]. Outro evento adverso é a depressão respiratória antes da administração do sedativo e bloqueador. Para evitar esse efeito, o fentanil deve ser feito na dose de até 3 mcg/kg lentamente, em 30 a 60 segundos. A síndrome do "tórax rígido" é outra complicação descrita, situação em que o paciente fica apneico e a ventilação com bolsa válvula máscara não é efetiva. Essa síndrome é resolvida com a administração de um bloqueador neuromuscular. Esse evento tende a acontecer somente com doses muito altas feitas rapidamente.
Um estudo relevante neste tema é o FAKT, publicado em 2022 [8]. Esse trabalho comparou fentanil versus placebo em ISR feita com quetamina e rocurônio. O desfecho primário foi a proporção de pacientes fora do intervalo de pressão sistólica de 100 a 150 mmHg. Não houve diferença entre os grupos em relação a esse desfecho. Apesar disso, mais pacientes no grupo placebo tiveram hipertensão e mais pacientes no grupo fentanil tiveram hipotensão. Mortalidade e dias livres de ventilação mecânica foram iguais nos dois grupos.
Como e quando fazer?
Apesar de não existir evidência definitiva, é possível traçar duas linhas sobre o fentanil na ISR. A primeira linha é que a droga deve ser evitada em pacientes hipotensos ou em choque, pois pode piorar a hipotensão. Hipotensão está associada com piores desfechos e ocorre em mais de 40% das intubações na emergência [9]. A segunda linha é a dos pacientes que mais podem se beneficiar, que são os seguintes:
- Hipertensos antes do procedimento E
- Com hipertensão intracraniana OU condições que pioram com elevações da pressão, como infarto agudo do miocárdio, dissecção de aorta e edema agudo de pulmão.
Nos pacientes que não estão nessas linhas, não há argumento forte contra ou a favor da administração. Contudo, não há evidência clara de benefício. Considerando que a IOT na emergência é um procedimento com alta taxa de complicações - 3% evoluem com parada cardíaca - intervenções sem benefício claro devem ser acrescentadas com cautela [9]. Ao simplificar o procedimento, reduz-se a ansiedade da equipe e o risco de erro cognitivo.
Se for optado por administrar o fentanil, ele deve ser feito aproximadamente 3 minutos antes do sedativo e do bloqueador. A dose é de 3 mcg/kg, administrados em 30 a 60 segundos. Em pacientes com hemodinâmica mais limítrofe, doses menores como 1 mcg/kg podem ser feitas.