Nova Definição de Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SDRA)

Criado em: 06 de Novembro de 2023 Autor: Pedro Rafael Del Santo Magno

A síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) é uma das principais causas de internação em UTI. Em julho de 2023 foi proposta uma nova definição global sobre SDRA [1]. Esse tópico explica as mudanças, comentando as vantagens e desvantagens da nova definição.

Qual o novo critério?

A SDRA é definida por uma lesão pulmonar inflamatória aguda e difusa. Pode ser causada por doenças como pneumonia, infecção com foco fora do pulmão, trauma, transfusão, queimadura, broncoaspiração ou choque. O último critério diagnóstico de SDRA havia sido publicado em 2012 [2], conhecido como critérios de Berlim.

Os critérios de Berlim envolviam quatro fatores:

  • Insuficiência respiratória: medida através da relação da pressão parcial de oxigênio pela fração inspirada de oxigênio (PaO2/FiO2). Essa relação deve ser menor ou igual a 300.
  • Tempo: a insuficiência respiratória deve ocorrer em menos de uma semana após o início do fator predisponente ou uma semana após a piora dos sintomas respiratórios.
  • Difuso: os achados pulmonares devem ser bilaterais, sendo vistos através de radiografia ou tomografia.
  • Afastar diagnósticos diferenciais: os sintomas não podem ser totalmente explicados por um quadro cardíaco. O paciente pode ter insuficiência cardíaca, mas deve ter também outro fator causador de SDRA.

A nova definição de SDRA foi criada por um comitê com 32 membros (veja tabela 1) [1]. Esses membros foram escolhidos de diferentes regiões do mundo, com o intuito de aumentar a representatividade.

Tabela 1
Novos critérios de síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA)
Novos critérios de síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA)

Um dos objetivos dessa atualização foi facilitar o reconhecimento de SDRA e ajudar que países com poucos recursos também consigam chegar ao diagnóstico. A falta de reconhecimento de SDRA é um problema global. Um trabalho nórdico encontrou que 20% dos pacientes com SDRA grave e até 50% daqueles com SDRA leve não tiveram o diagnóstico de SDRA reconhecido pela equipe [3].

As principais mudanças da nova definição foram:

  • Incluir cateter nasal de alto fluxo, com um fluxo mínimo de 30 L/min
  • Como alternativa a relação PaO2/FiO2 menor ou igual a 300 mmHg, existe a possibilidade de utilizar a relação saturação periférica (SpO2)/FiO2 menor ou igual a 315
  • Uso do ultrassom para confirmar os achados bilaterais em parênquima pulmonar.

Por que a mudança do suporte ventilatório?

O critério de Berlim incluía apenas pacientes com suporte ventilatório com pressão positiva em ventilação mecânica invasiva ou não-invasiva. Era obrigatório que o suporte ventilatório disponibilizasse uma PEEP mínima de 5 cm H2O. Isso excluía o cateter nasal de alto fluxo (CNAF), uma terapia que tem sido mais empregada nos últimos anos.

O CNAF é um dispositivo não invasivo de suporte respiratório, em que é possível controlar o fluxo e a FIO2, porém não é possível garantir uma PEEP. Seu uso tem aumentado principalmente após a publicação do estudo FLORALI [4]. Esse artigo já foi comentado no tópico Uso de Cateter Nasal de Alto Fluxo (CNAF) na Insuficiência Respiratória Aguda.

O FLORALI tem algumas ressalvas, entre elas o fato que 21% dos pacientes tinham achados pulmonares unilaterais, incompatíveis para SDRA. Apesar disso, esse estudo alavancou o uso de CNAF e fez com que o comitê incluísse esse dispositivo nos critérios diagnósticos de SDRA.

Nos critérios atuais, pacientes utilizando cateter nasal de alto fluxo foram incluídos, contanto que estejam sob uso de um fluxo mínimo de 30 L/min. O valor mínimo de 30 L/min é estabelecido porque fluxos com esses valores parecem gerar uma pressão positiva pequena (apesar de não quantificável), principalmente se o paciente estiver de boca fechada [5].

O critério atual também acrescentou uma modificação na definição caso o paciente esteja em local com recursos limitados. Nesses locais, o paciente não precisa de PEEP mínima ou fluxo inspiratório mínimo, contanto que preencha o critério de oxigenação.

Por que a mudança do critério da oxigenação?

Em locais que não possuem acesso à gasometria, não seria possível preencher o critério de Berlim da relação PaO2/FiO2 menor ou igual a 300. Os novos critérios propõem o uso da saturação periférica de O2 (SpO2) para abordar essa limitação. O parâmetro proposto é a razão de SpO2/FiO2 menor igual a 315. Esse critério só pode ser utilizado se a oximetria de pulso estiver menor ou igual à 97%.

Essa alteração é baseada na modificação de Kigali da definição clínica de SDRA [6]. A definição de Kigali sugeria o uso da saturação periférica nos critérios diagnósticos, porém ainda não tinha sido incorporada na definição de Berlim. Pacientes com o critério da saturação possuem características clínicas e desfechos parecidos com os pacientes que preenchem os critérios gasométricos [7].

Em um local com recursos limitados, o paciente preenche o critério de SDRA se estiver utilizando uma máscara não-reinalante (dispositivo que não possui fluxo inspiratório estabelecido e nem PEEP) e possuir uma SpO2/FIO2 menor que 315.

Críticas aos novos critérios

Recentemente, alguns estudos indicaram uma confiabilidade reduzida dos oxímetros de pulsos em pacientes de pele negra. Um trabalho publicado no New England Journal of Medicine em 2020 mostrou que, em 11% dos pacientes negros, o oxímetro mostrou uma saturação acima de 92%, porém o paciente possuía um SatO2 abaixo de 88% quando verificado pela gasometria [8]. Essa discrepância ocorreu em apenas 3% dos pacientes de pele branca.

Outra crítica é que os novos critérios tornaram o diagnóstico de SDRA mais heterogêneo. Isso dificulta a distinção entre pacientes que possuem baixa necessidade de fluxo de oxigênio, em relação àqueles que necessitam de medidas mais invasivas. A população incluída nos estudos tende a ficar mais heterogênea, sendo mais difícil de replicar os achados na prática diária.

Ainda são necessárias validações futuras desse novo critério.

Nova Diretriz de Febre na UTI

Criado em: 06 de Novembro de 2023 Autor: Kaue Malpighi

Febre é comum em ambientes de terapia intensiva e tem um amplo diagnóstico diferencial. Sua ocorrência pode estar associada a pior prognóstico, aumento de custo de internação, risco de procedimentos desnecessários e potencial uso inapropriado de antibióticos. Em outubro de 2023, a Society of Critical Care Medicine e a Infectious Diseases Society of America lançaram uma nova diretriz sobre o assunto. As principais recomendações são abordadas neste tópico [1].

Definições

As definições de febre variam de acordo com diretrizes, idade e condições médicas do paciente. Algumas valores possíveis incluem:

  • Temperaturas superiores a 38,3 ºC em pacientes críticos.
  • Temperaturas acima de 37,8 ºC em pacientes idosos.
  • Temperaturas acima de 38,3 ºC ou 38 ºC por mais de uma hora em pacientes neutropênicos.

Os métodos mais confiáveis para medir a temperatura são o cateter de artéria pulmonar, sondas vesicais e termômetros esofágicos, mas são menos disponíveis. A aferição oral ou retal é preferível à axilar ou temporal, pois tem menor variação em relação à temperatura central [2].

O valor prognóstico da febre em pacientes críticos é incerto. Os riscos aumentam com temperaturas extremas (superiores a 39,5 ºC) ou quando a elevação da temperatura não está ligada a uma causa infecciosa. Em casos de internação prolongada, uma tendência de aumento da temperatura ao longo do tempo pode ser mais indicativa de infecção do que um pico isolado [3].

Tabela 1
Diferenças entre febre e hipertermia
Diferenças entre febre e hipertermia

Hipertermia é uma condição distinta da febre e ocorre por excesso de produção de calor. Costuma estar associada a temperaturas muito elevadas, frequentemente acima de 40 a 41 ºC, com resposta fraca a antipiréticos. A sua etiologia é comumente não infecciosa (veja tabela 1).

Exames laboratoriais e culturas

Febre em pacientes críticos está associada a infecção em cerca de 50% dos casos. Além de uma investigação de infecções individualizada, deve-se considerar causas não infecciosas para febre, especialmente quando o foco infeccioso não é claro (veja tabela 2).

Tabela 2
Causas não infecciosas de febre na UTI
Causas não infecciosas de febre na UTI

A solicitação de culturas deve ser feita de forma individualizada para minimizar o risco de contaminação, o uso desnecessário de antibióticos e custos associados.

Em pacientes com febre e cateter venoso central sem um foco infeccioso claro, a diretriz recomenda coleta de hemoculturas do cateter central concomitante à coleta de culturas periféricas para avaliar infecção de corrente sanguínea associada a cateter. Em caso de múltiplas vias do cateter central, a coleta de hemoculturas de pelo menos duas delas é aconselhada para aumentar a sensibilidade.

Em pacientes com sonda vesical que não podem se comunicar, a febre pode ser o único indicativo de infecção urinária. Nesses casos, recomenda-se trocar o cateter e coletar uma nova amostra de urina do novo dispositivo. Se houver leucocitúria na nova urina, aí sim solicitar a urocultura da nova sonda. Infecções relacionadas a cateter vesical no contexto de febre sem foco são menos comuns que outras infecções, exceto quando há manipulação urológica, disfunção do cateter ou imunossupressão.

Culturas de secreção traqueal, principalmente de aspirados, não devem ser solicitadas sem alterações respiratórias novas por forte associação com contaminação. A principal indicação para coleta dessas culturas é na suspeita de pneumonia associada à ventilação, em situações que incluem febre, novas alterações radiográficas, piora da secreção respiratória ou deterioração dos parâmetros de ventilação mecânica.

Em pacientes com pneumonia ou sintomas de via aérea superior, a diretriz recomenda coleta de painel viral de secreções de via aérea superior. Em pacientes intubados, pode-se considerar coleta para influenza e SARS-CoV-2 de secreção de via inferior para melhor acurácia.

A dosagem de proteína C reativa (PCR) e procalcitonina pode ser considerada em dois cenários:

  • Para auxiliar na exclusão de causas bacterianas em pacientes com febre sem foco infeccioso identificado e com baixa probabilidade de infecção bacteriana. Valores de PCR menores que 20 mg/dl e de procalcitonina menores que 0,1 mcg/L reduzem significativamente a probabilidade de uma etiologia bacteriana.
  • Para auxiliar na suspensão de antibióticos em pacientes com melhora dos parâmetros infecciosos e queda de 80% dos valores de procalcitonina [4, 5].

Exames de imagem

Para a maioria dos pacientes em UTI com febre, recomenda-se a realização de radiografia de tórax, a menos que exista um foco claro de infecção. A diretriz não emite uma recomendação específica quanto ao uso de tomografia de tórax. No entanto, sua solicitação pode ser apropriada em pacientes com:

  • Doença pulmonar prévia
  • Sintomas respiratórios e suspeita de pneumonia apesar de radiografia normal [6].
  • Neutropenia [7].

Não é recomendado o uso rotineiro de ultrassonografia de abdome ou tomografia de abdome com contraste para investigação de pacientes sem alterações de função hepática, enzimas canaliculares ou cirurgias abdominais recentes.

No contexto pós-operatório, se houver febre sem foco infeccioso claro, deve-se considerar a realização de tomografia computadorizada do sítio cirúrgico antes de investigar outros possíveis locais de infecção [8].

Quando a tomografia de tórax revela atelectasia no pós-operatório de pacientes com febre, deve-se investigar outras causas. Embora atelectasias sejam comuns neste contexto, não parece haver causalidade com febre [9]. As causas mais comuns de febre no pós-operatório precoce incluem inflamação secundária à cirurgia, pneumonia e infecção do sítio cirúrgico precoce (menos de 5 dias pós-operatórios). Veja mais no tópico sobre febre no pós-operatório.

PrEP e PEP - Profilaxia Medicamentosa para Infecções Sexualmente Transmissíveis

Criado em: 06 de Novembro de 2023 Autor: Frederico Amorim Marcelino

Este tópico foi atualizado. Acesse "Atualização sobre Profilaxia Pré-exposição (PrEP) Semestral para HIV" para ver as novidades.

Profilaxia pré-exposição (PrEP) e profilaxia pós exposição (PEP) são estratégias de prevenção de infecção pelo HIV recomendadas pelo Ministério da Saúde. Em agosto de 2023, a United States Preventive Service Task Force (USPSTF) publicou uma revisão sistemática sobre PREP para HIV. Em abril de 2023, um estudo de PEP para infecções bacterianas sexualmente transmissíveis foi publicado no New England Journal of Medicine (NEJM) [1, 2]. Este tópico discute esses dois conceitos.

O que é PrEP para HIV

A profilaxia pré-exposição (PrEP) para HIV é feita com uso de antivirais. Existem duas formas principais de PrEP:

  • PrEP contínua: uso de antivirais diariamente, independentemente de frequência de relações sexuais.
  • PrEP sob demanda: uso de antivirais antes de uma exposição sexual, mantendo a medicação por um curto período após a relação.

Os principais esquemas estudados de PrEP são:

  • Tenofovir alafenamida (TAF) e entricitabina (FTC)
  • Tenofovir desoproxila (TDF) e entricitabina (FTC)
  • Tenofovir desoproxila (TDF) em monoterapia
  • Cabotegravir em monoterapia

O principal esquema usado no Brasil e disponibilizado no SUS é o comprimido coformulado de tenofovir e entricitabina, que atuam na transcriptase reversa. O cabotegravir atua na integrase e é de administração injetável. A medicação já foi aprovada pela ANVISA e aguarda avaliação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (CONITEC) para possível incorporação no SUS.

A evidência para o uso da PrEP foi revisada na atualização e revisão sistemática da USPSTF publicada no Journal of the American Medical Association [1]. Foram selecionados 32 estudos, sendo 20 randomizados e controlados. O uso de PrEP foi associado a diminuição do número de infecções por HIV com uma redução relativa do risco em 54%. A eficácia foi relacionada à aderência - em pacientes com aderência maior do que 70%, a redução relativa do risco foi de 73%.

A PrEP foi estudada e se mostrou efetiva em grupos com maior risco para infecção por HIV, incluindo:

  • Casais heterossexuais sorodiscordantes [3, 4]
  • Homens que fazem sexo com homens [5, 6, 7, 8]
  • Mulheres trans [9]
  • Usuários de droga injetável [10]

Com relação a efeitos colaterais, o tenofovir desoproxila pode causar nefrotoxicidade tubular e alteração da densidade mineral óssea. Em pacientes que usaram PrEP oral houve aumento de creatinina e mais episódios de náusea. Não houve diferença em eventos adversos graves ou aumento de infecções sexualmente transmissíveis (IST) em pacientes que usaram PrEP.

Como prescrever PrEP no Brasil

Cuidados antes da prescrição

Antes de iniciar a PrEP deve-se excluir a infecção pelo HIV. Recomenda-se realizar teste rápido anti-HIV em sangue total, soro ou plasma. Testes rápidos que usam fluido oral são contraindicados devido a baixa sensibilidade. Para pacientes com quadro suspeito de infecção aguda, a carga viral por reação em cadeia da polimerase (PCR) pode ser solicitada.

A profilaxia pós-exposição (PEP) deve ser oferecida no lugar da PrEP em pacientes que tiveram exposição de risco ao HIV nas últimas 72 horas. Após o período de 28 dias de uso de PEP, o paciente que não se infectou e mantém risco de infecção, tem indicação de usar PrEP.

Escolha da PrEP e prescrição

No Brasil estão disponíveis a PrEP oral contínua e a PrEP sob demanda. O Ministério da Saúde recomenda a prescrição de PrEP contínua para pacientes a partir de 15 anos, com mais de 35 kg de peso corporal que apresentem risco aumentado de infecção pelo HIV [11]. Não há definição consensual para o "risco aumentado de infecção pelo HIV". O fluxograma 1 demonstra uma sugestão para a tomada de decisão.

Fluxograma 1
Avaliação de indicação de PrEP em adultos sexualmente ativos
Avaliação de indicação de PrEP em adultos sexualmente ativos

A PrEP contínua disponível no Brasil via SUS é com TDF 300 mg e FTC 200 mg em comprimido coformulado. Recomenda-se uma dose inicial de dois comprimidos no primeiro dia. A dose de manutenção é de um comprimido ao dia.

As indicações de PrEP sob demanda são mais restritas (tabela 1). O esquema recomendado é de TDF 300 mg e FTC 200mg em comprimido coformulado. A dose é de dois comprimidos duas a 24 horas antes da relação sexual, um comprimido 24 horas após a dose inicial e um comprimido 48 horas após a primeira dose.

Tabela 1
Público alvo de profilaxia pré-exposição (PrEP) sob demanda
Público alvo de profilaxia pré-exposição (PrEP) sob demanda

No âmbito da saúde privada, a prescrição deve ser feita por profissional médico. Já no SUS a prescrição pode ser realizada por médico, farmacêutico ou enfermeiro. Devem ser preenchidos os formulários de cadastro do paciente via SUS e de prescrição da PrEP, entregues em conjunto com uma receita simples com o esquema recomendado.

A medicação é disponibilizada inicialmente por 30 dias até o primeiro retorno. Nessa consulta é repetido o exame de HIV e caso o paciente tenha aderido ao tratamento é feita uma nova prescrição para até quatro meses. Assim, os retornos subsequentes são a cada quatro meses. O paciente deve ser orientado que níveis protetores da medicação são alcançados na mucosa anal após sete dias do início da medicação e na mucosa vaginal após 20 dias do início da medicação. Durante esse período, o paciente deve receber orientação de outros métodos de profilaxia.

Avaliação clínica adicional

Tabela 2
Seguimento de usuários de profilaxia pré-exposição (PrEP)
Seguimento de usuários de profilaxia pré-exposição (PrEP)

A avaliação de função renal é recomendada para todos os pacientes candidatos à PrEP. Devido ao potencial de nefrotoxicidade do tenofovir, a PrEP é contraindicada em pacientes com clearance de creatinina < 60mL/min. Em pacientes já em uso de PrEP é recomendada a reavaliação da função renal a cada 12 meses. Em pacientes com maior risco de disfunção renal é recomendada avaliação a cada seis meses. O acompanhamento clínico e laboratorial da PrEP está detalhado na tabela 2.

PEP bacteriana e o estudo DoxyPEP

A PEP é o uso de medicações para prevenir infecção após eventos com possibilidade de transmissão. No contexto de IST, pode ser feita para evitar infecções virais (HIV e hepatite B) e bacterianas (gonorreia, clamídia e sífilis).

A PEP para HIV é indicada em pacientes que tiveram exposição de risco (tabela 3) nas últimas 72 horas, preferencialmente nas últimas 24 horas. O esquema prescrito é tenofovir 300 mg e lamivudina 300 mg em comprimido coformulado associados a dolutegravir 50 mg. É recomendada dose única diária por 28 dias [12].

Tabela 3
Risco de transmissão de HIV
Risco de transmissão de HIV

A PEP bacteriana com doxiciclina foi avaliada pelo DoxyPEP, um estudo randomizado, não cego, publicado em abril de 2023 no New England Journal of Medicine [2].

A amostra incluiu 501 participantes, sendo homens que fazem sexo com homens e mulheres trans em uso de PrEP para HIV ou vivendo com HIV. Os pacientes foram randomizados para receber doxiciclina 200 mg dentro de 72 horas após uma relação sexual sem preservativo ou tratamento padrão (aconselhamento, rastreio e tratamento se indicado). O desfecho primário foi o diagnóstico de pelo menos uma IST bacteriana (gonorreia, clamídia ou sífilis) em avaliação laboratorial realizada a cada três meses.

Nos pacientes vivendo com HIV, ISTs foram diagnosticadas em 11,8% do grupo doxiciclina e em 30,5% do grupo padrão. Já nos pacientes em uso de PrEP para HIV, uma IST foi diagnosticada em 10,7% dos pacientes do grupo doxiciclina e em 31,9% do grupo padrão. Houve redução da incidência das três IST - gonorreia, clamídia e sífilis.

Existe uma preocupação quanto ao desenvolvimento de resistência com o uso de PrEP e PEP. Culturas de uma parcela dos pacientes do estudo DoxyPEP identificaram maior resistência a tetraciclinas no grupo que usou doxiciclina. Também há um receio de aumento de resistência à ceftriaxona com o uso de doxicilina [13]. Estudos avaliando os efeitos a longo prazo dessas intervenções podem solucionar essas dúvidas.