Análogos de GLP-1 para Doença Renal Crônica

Criado em: 17 de Junho de 2024 Autor: Caio Bastos

Os análogos de GLP-1 são medicações desenvolvidas para diabetes mellitus que também demonstraram benefício para o tratamento de obesidade. Em maio de 2024, foi publicado no New England Journal of Medicine o estudo FLOW, avaliando o benefício renal da semaglutida em pacientes portadores de doença renal crônica e diabetes mellitus [1]. Esse tópico revisa os principais achados desse estudo.

Evidências dos análogos do GLP-1

Os análogos do GLP-1 (aGLP-1), como a semaglutida e a liraglutida, são agentes que demonstraram benefícios no tratamento de obesidade e diabetes mellitus tipo 2 (DM2). Em pacientes com obesidade, estão associados a perda de peso, diminuição de desfechos cardiovasculares e a diminuição de sintomas por insuficiência cardíaca de fração de ejeção preservada. Já em pacientes com diabetes, estão associados ao controle glicêmico, diminuição de peso e diminuição de desfechos cardiovasculares [2, 3]. Veja mais sobre a semaglutida na prevenção de eventos cardiovasculares e insuficiência cardíaca de fração de ejeção preservada.

Foram identificados benefícios contra disfunção renal em pacientes com DM2 em análises secundárias de múltiplos estudos. Contudo, nenhum trabalho havia sido realizado com o foco principal em desfechos renais.

Existem novas medicações também agonistas do GLP-1, os duplo agonistas (GLP-1 e GIP), como a tirzepatida, e os triplo agonistas (GLP-1, GIP e do glucagon), como a retatrutida. Veja mais sobre essas medicações nos tópicos sobre retatrutida e tirzepatida para obesidade.

Sobre o estudo FLOW

O FLOW foi um estudo internacional duplo-cego, randomizado, controlado com placebo, que envolveu 3533 participantes com DM2 e doença renal crônica (DRC). Os pacientes eram randomizados para semaglutida 1 mg/semana ou placebo.

O critério de inclusão envolvia ter DM2 com valores de hemoglobina glicada < 10% e uso em dose máxima tolerada de inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA) ou bloqueadores do receptor de angiotensina II (BRA). Além disso, os pacientes deviam ter DRC com uma das seguintes características:

  • Taxa de filtração glomerular estimada (TFGe) de 50 a 75 ml/min/1,73m2 e relação albumina/creatinina (A/C) na urina entre 300 a 5000 mg/g OU
  • TFGe de 25 a 49 ml/min/1,73m2 e A/C entre 100 e 5000 mg/g

A população selecionada apresenta um risco maior de desfechos renais negativos do que as populações estudadas previamente. Pacientes em uso de inibidores de SGLT2 (iSGLT2) e finerenona também eram permitidos no estudo.

O desfecho primário foi um composto de eventos renais maiores. Os seguintes desfechos individuais entravam no desfecho composto:

  • Início de hemodiálise em regime crônico, transplante renal ou redução da taxa de filtração glomerular estimada (TFGe) para valores <15 ml/min/1,73m2 por ≥ 4 semanas
  • Redução da TFGe em ≥50% em relação ao basal por ≥ 4 semanas
  • Morte por causas renais ou cardiovasculares

Os participantes do grupo semaglutida apresentaram uma redução de 24% do desfecho primário. Dentre os desfechos, houve destaque para os componentes de redução sustentada da TFGe ≥50% e mortalidade cardiovascular. A mediana de observação de 3,4 anos.

Dos desfechos secundários, a redução da TFGe foi mais lenta (1,16 ml/min/1,73m2/ano), o risco de eventos cardiovasculares foi 18% menor e a mortalidade por todas as causas 20% menor no grupo semaglutida. Além disso, os participantes do grupo semaglutida também apresentaram uma redução 32% maior na relação A/C. Como esperado, houve maior redução de peso (4 kg a menos) e controle da hemoglobina glicada nos usuários de semaglutida.

Em relação aos efeitos colaterais, efeitos gastrointestinais foram mais comuns no grupo semaglutida, sendo este inclusive o principal motivo para a interrupção da medicação. Em relação a efeitos adversos maiores, o grupo semaglutida apresentou um número menor do que o placebo, especialmente às custas de menor número de infecções (incluindo COVID-19) e eventos cardiovasculares.

Críticas ao estudo e o que muda na prática?

A principal limitação do estudo foi a baixa participação de pacientes em uso de terapias já comprovadamente benéficas na DRC, como os iSGLT2, representados pela dapagliflozina e empagliflozina, e os agonistas não hormonais mineralocorticóides, representados pela finerenona. Veja mais sobre essas medicações em no tópico sobre gliflozinas e finerinona.

Na análise por subgrupos, não foi visto benefício da semaglutida nos pacientes que usavam iSGLT2 previamente, apesar do estudo não ter poder para avaliar com confiança esse dado. Uma nova revisão dos dados, incluindo a avaliação do impacto da introdução dos iSGLT2 durante o seguimento, já foi anunciada e deve ser publicada em 2024. Também na análise de subgrupos, pacientes não-obesos não apresentaram um benefício claro do uso da medicação.

Os aGLP-1 já são recomendados formalmente pelo Kidney Disease: Improving Global Outcomes (KDIGO) para o controle do DM2, como já revisado no tópico sobre atualização do KDIGO de manejo de DRC. Contudo, ainda não está claro qual o papel dos aGLP-1 especificamente na melhora de desfechos renais quando comparado aos iSGLT2 e à finerenona. Como proposto pelos autores do estudo, será necessário individualizar cada paciente para definir a ordem e prioridade do início dessas medicações, tendo em mente também seus efeitos extra-renais. Estudos de coorte já trazem o potencial benefício da associação dessas classes de medicamentos, tanto do ponto de vista cardiovascular como renal [4]. Contudo, novos ensaios clínicos randomizados são necessários para avaliar a melhor maneira de combinar essas terapias.

Choque Cardiogênico e Dispositivos de Assistência Circulatória

Criado em: 17 de Junho de 2024 Autor: Kaue Malpighi

O infarto agudo do miocárdio é a principal causa de choque cardiogênico. Atualmente, a mortalidade de choque cardiogênico ainda é alta, podendo chegar a 50%. A rápida identificação e instituição de suporte hemodinâmico é crucial. Em março de 2024, foi publicado o estudo DanGer Shock no New England Journal of Medicine sobre uso da bomba de fluxo microaxial (dispositivo Impella CP) no choque cardiogênico após infarto [1]. Este tópico expõe o manejo do choque cardiogênico e o que o estudo acrescentou.

Definição e classificação

Choque cardiogênico é um estado de hipoperfusão orgânica secundária à disfunção cardíaca. A definição varia na literatura, sendo a do estudo SHOCK de 1999 a mais utilizada [2]:

  • Critérios clínicos:
    • Pressão arterial sistólica (PAS) < 90 mmHg por mais de 30 minutos ou necessidade de vasopressor E
    • Hipoperfusão orgânica
  • Critérios hemodinâmicos:
    • Índice cardíaco ≤ 2,2 L/min/m² E
    • Pressão de oclusão da artéria pulmonar (POAP) > 15 mmHg - medida que reflete as pressões do átrio esquerdo.

Estes quatro critérios definidores são obrigatórios e apresentam algumas falhas. O critério de hipotensão pode atrasar o reconhecimento, sendo que até 5% dos pacientes podem estar normotensos [3].

A medida de POAP precisa de meios invasivos para sua aferição (cateter de artéria pulmonar, também conhecido como Swan-Ganz) e nem sempre está disponível. Além disso, uma disfunção predominante de ventrículo direito (VD) pode não apresentar alteração significativa da POAP.

Figura 1
Estágios do choque cardiogênico - SCAI SHOCK
Estágios do choque cardiogênico - SCAI SHOCK

A classificação de choque cardiogênico mais utilizada é a SCAI (veja figura 1). Ela está relacionada ao prognóstico e auxilia nas decisões terapêuticas.

Etiologias e diagnóstico

O infarto agudo do miocárdio (IAM) é a principal causa de choque cardiogênico, representando até 30% dos casos [4, 5]. Outras etiologias incluem:

  • Insuficiência cardíaca (IC) crônica agudizada - representa 58% dos casos não associados ao infarto.
  • Valvopatias.
  • Miocardite.
  • Cardiomiopatia por estresse (cardiomiopatia de Takotsubo).

O diagnóstico de choque cardiogênico envolve medidas invasivas e não invasivas. De forma não invasiva, buscam-se sinais de hipoperfusão (alteração do estado mental, extremidades frias, débito urinário reduzido e lactato elevado) e sinais de congestão pulmonar ou sistêmica. Há hipotensão frequentemente, mas a sua presença não é obrigatória para caracterizar choque cardiogênico.

A ecocardiografia à beira leito é essencial para a rápida avaliação da função do ventricular esquerda ou direita como responsável pelo choque. Pacientes com angina, história de IC ou com alterações ecocardiográficas sugerem um componente cardiogênico para um choque inexplicado.

Meios invasivos para o diagnóstico são mais utilizados em ambiente de terapia intensiva e a principal ferramenta é o cateter de Swan-Ganz. Ele pode fornecer informações hemodinâmicas de forma rápida para um manejo individualizado, apesar da sua influência em mortalidade ser incerta [6-8]. Um índice cardíaco baixo com POAP elevada confirmam o diagnóstico.

Tratamento

Inotrópicos e vasopressores são as drogas de escolha para o suporte a pacientes com choque cardiogênico. Devem ser utilizadas com base em parâmetros de perfusão e na menor dose e tempo possíveis, para evitar aumento da demanda de oxigênio miocárdico, arritmias e mortalidade [9-11].

Noradrenalina

É a droga de escolha em pacientes com hipotensão (PAS < 90 mmHg). Apresenta intensa atividade alfa-1, com efeito vasoconstritor. A atividade beta-1 auxilia no inotropismo e cronotropismo.

No choque cardiogênico, a noradrenalina é necessária em pacientes hipotensos para manter a pressão de perfusão tecidual, aumentando a PAS. Isso possibilita a introdução dos inotrópicos, que apresentam potencial vasodilatador, podendo piorar a hipotensão inicialmente.

Não há um alvo claro na literatura, mas PAS > 90 mmHg e pressão arterial média (PAM) entre 65 a 75 mmHg parecem ser adequados, em conjunto com avaliação de sinais de hipoperfusão [12-14].

Inotrópicos

A droga mais utilizada é a dobutamina, devendo ser titulada conforme sinais de perfusão. Além de beta-1, exerce atividade beta-2 com vasodilatação sistêmica.

Não há evidências de superioridade entre os inotrópicos (dobutamina, milrinone e levosimendana - veja tabela 1) [15, 16]. Milrinone e levosimendana não atuam em receptores beta, sendo considerados quando há uso crônico de beta-bloqueadores. Apesar de não ser contraindicado o uso de dobutamina em pacientes em uso de beta-bloqueadores, doses mais altas podem ser necessárias [17].

Tabela 1
Inotrópicos no choque cardiogênico
Inotrópicos no choque cardiogênico

Dispositivos de assistência circulatória

O dispositivo de assistência circulatória de curta permanência mais disponível é o balão intra-aórtico (BIA). É indicado principalmente em caso de falha na terapia medicamentosa ou rápida piora hemodinâmica. Em relação a outros dispositivos, possui menor custo e mais fácil inserção, porém fornece menor suporte hemodinâmico.

Outros dispositivos de assistência circulatória (como Impella, TandemHeart e CentriMag) fornecem suporte hemodinâmico maior quando comparado ao BIA. Esses dispositivos são menos disponíveis e têm inserção mais difícil.

BIA e Impella são utilizados para suporte hemodinâmico como ponte para uma terapia definitiva ou planejamento de longo prazo (resolução da etiologia, realização de transplante cardíaco ou instalação de dispositivos de suporte de longa permanência). Por serem terapias de ponte, não há evidências claras de benefício de mortalidade com seu uso.

O que o novo estudo encontrou?

O DanGer Shock foi um estudo randomizado, não cego, realizado na Alemanha, Dinamarca e Inglaterra. Incluiu pacientes com choque cardiogênico por IAM com supradesnivelamento do segmento ST para receberem suporte com bomba de fluxo microaxial (Impella CP) e terapia padrão ou apenas a terapia padrão [1]. O choque cardiogênico foi definido como PAS < 100 mmHg, sinais de hipoperfusão tecidual e fração de ejeção < 45%.

Os pacientes do grupo intervenção receberam suporte circulatório com Impella no momento da randomização, que poderia ocorrer antes do cateterismo ou até 12 horas após sua realização. Essa abordagem é considerada precoce, já que dispositivos circulatórios são geralmente utilizados em pacientes refratários ou com piora hemodinâmica rápida. Pacientes do grupo controle podiam receber suporte circulatório se indicado, sendo incentivado o uso de ECMO venoarterial em vez do Impella.

O desfecho primário avaliado foi mortalidade em 180 dias. Desfechos de segurança incluíram sangramentos graves, isquemia associada a punção arterial, hemólise e necessidade de terapia substitutiva renal (TSR).

O estudo encontrou uma redução de mortalidade no grupo intervenção (45,8% versus 58,5%, RR 0,74, 0,55 - 0,99 IC 95%, p=0,04). O grupo intervenção também apresentou maior risco de sangramento, isquemia de membros e necessidade de TSR de forma significativa.

Em análise de subgrupos, pacientes mais graves (PAM ≤ 63 mmHg) e com complexidade maior das lesões coronárias apresentaram maior benefício com uso do Impella.

Este foi o primeiro estudo que mostrou benefício de mortalidade com o uso de dispositivos de assistência circulatória de maneira significativa. Seu uso de forma precoce pode ter favorecido o desfecho encontrado, porém também associou-se com mais complicações. Pacientes selecionados com maior gravidade devem apresentar melhor relação entre os riscos e benefícios com seu uso. Os achados incentivam a criação de equipes especializadas em choque cardiogênico para identificar precocemente os pacientes candidatos ao Impella.

Isquemia Mesentérica

Criado em: 17 de Junho de 2024 Autor: Pedro Rafael Del Santo Magno

Em 2024, o New England Journal of Medicine — Evidence trouxe dois artigos de revisão sobre isquemia mesentérica, uma condição grave e de difícil reconhecimento [1, 2]. Este tópico aproveita as publicações para discutir o tema.

Tipos de isquemia mesentérica

Isquemia mesentérica ocorre quando o fluxo sanguíneo para o intestino é insuficiente para suprir a demanda metabólica local. O atraso no reconhecimento influencia nas taxas de mortalidade, estimadas em 60 a 80% [3]. Os tipos de isquemia mesentérica são categorizados pela causa e cronicidade da interrupção do fluxo sanguíneo (fluxograma 1).

Fluxograma 1
Tipos de isquemia mesentérica
Tipos de isquemia mesentérica

A obstrução arterial aguda é a causa mais comum e é uma emergência médica. As principais etiologias são a embolia (40 a 50% dos casos) e a trombose de um vaso mesentérico estenosado (20 a 35% dos casos). Em menos de 5% dos casos, é decorrente da dissecção ou inflamação arterial.

A obstrução arterial também pode ser crônica, em pacientes com doença aterosclerótica progressiva. O principal fator de risco relacionado é tabagismo [4].

A trombose venosa intestinal pode causar edema e prejudicar o fluxo sanguíneo local. Esse evento ocorre em 5 a 15% dos casos de isquemia mesentérica. É possível identificar um fator causal em 90% dos casos de trombose venosa intestinal, como trauma, trombofilias ou inflamação local (por exemplo, pancreatite e diverticulite).

Alguns pacientes podem apresentar isquemia mesentérica não-oclusiva. Isso ocorre em situações de baixo fluxo transitório, como choque, insuficiência cardíaca ou em pacientes em hemodiálise [5]. Espasmos das artérias intestinais podem acontecer em pacientes em uso de cocaína ou vasopressores [1].

Outro diagnóstico que pode ser enquadrado como isquemia intestinal é a colite isquêmica. Diferente de isquemia mesentérica, na colite isquêmica raramente um embolo ou trombo causados por fibrilação atrial ou estados de hipercoagulabilidade é responsável pelo quadro. O mais comum é um estado de hipofluxo não oclusivo levando a isquemia de regiões já com menor irrigação (por exemplo, a flexura esplênica). Os sintomas principais são sangramento e diarreia com dor leve em abdome inferior, tipicamente em idosos. A colite isquêmica é geralmente estudada a parte de outras isquemias intestinais e não será abordada neste tópico.

Manifestações clinicas

A isquemia mesentérica é mais comum em pacientes mais velhos, com média de idade de 76 anos. A prevalência é maior que a de aneurisma abdominal roto em pacientes acima de 75 anos [6].

A apresentação clássica da isquemia mesentérica arterial aguda é a dor abdominal desproporcional ao exame físico. Apesar de dor intensa, alterações ao exame físico abdominal como dor à descompressão, defesa e rigidez são infrequentes. Febre e sinais de peritonismo podem ocorrer na doença avançada, devido necrose tecidual levando a perfuração e peritonite.

O diagnóstico deve ser considerado na presença de dor abdominal e fatores de riscos relevantes. Os principais fatores de risco são fibrilação atrial e história recente de infarto agudo do miocárdio.

Nos pacientes com trombose venosa, a dor está presente na maioria das vezes. Ocorre de forma insidiosa, podendo durar mais do que 48 horas em 75% dos casos [7, 8]. Sangramento gastrointestinal acontece em 15% dos casos. Fatores de riscos relevantes para trombose venosa intestinal são:

  • Diagnósticos de trombofilias
  • Trombose venosa recente
  • Cirurgias recentes abdominais
  • Doença inflamatória abdominal (infecção ou autoimune)
  • Neoplasia
  • Cirrose hepática
  • Trombose da veia porta

Na isquemia mesentérica crônica, o principal sintoma é dor abdominal de 30 a 60 minutos após se alimentar. Isso pode restringir a ingesta e causar perda de peso, algo incomum em outras causas de dor pós-prandial, como úlcera péptica e colelitíase. Neoplasias do trato gastrointestinal são um diagnóstico diferencial importante e devem ser afastadas. Outras manifestações da isquemia mesentérica crônica incluem diarreia, constipação e vômitos [4]. Apesar de ser uma lesão crônica, pode acontecer deterioração clínica rápida [1].

Como diagnosticar?

Diante da suspeita clínica, o exame inicial é a angiotomografia de abdome. Nenhum exame laboratorial tem acurácia boa para impedir ou atrasar a realização de exames de imagem em casos de suspeita clínica. Elevação do lactato, dos leucócitos e da desidrogenase láctica podem ocorrer em estágios mais avançados e graves da doença.

A angiotomografia de abdome possui acurácia de 95 a 100% para o diagnóstico de isquemia mesentérica aguda. Além de estenoses e interrupções de fluxo sanguíneo, a tomografia (TC) também pode mostrar pneumatose intestinal e ar livre na cavidade abdominal [9, 10].

A TC pode diferenciar embolismo de trombose. Isquemia embólica é geralmente identificada como uma obstrução distando 3 a 15 cm da origem da artéria mesentérica superior. A lesão isquêmica costuma poupar jejuno proximal, acometendo jejuno distal, íleo e cólon ascendente. A TC também pode visualizar outros efeitos do embolismo, como infartos esplênicos ou renais. Ausência de sinais de embolismo e presença de calcificação extensa na aorta sugerem causa trombótica [1].

A angiorressonância também possui acurácia acima de 95% [9]. O uso da ressonância é limitado em pacientes com claustrofobia, dispositivos metálicos e pelo tempo de detecção da imagem. A ultrassonografia consegue detectar estenoses em artéria celíaca e mesentérica superior, sendo útil nos casos de isquemia mesentérica crônica [11].

A arteriografia por cateter é reservada para casos difíceis, uma vez que métodos menos invasivos são bastante acurados e mais disponíveis. Possui a vantagem de permitir diagnóstico e tratamento simultâneos (como trombólise in situ ou angioplastia).

Como tratar?

O tratamento da isquemia mesentérica arterial se baseia no restabelecimento do fluxo sanguíneo, seja por via endovascular ou cirurgia aberta. Não existem estudos clínicos randomizados que comparem as estratégias. Estudos retrospectivos mostraram revascularização em 87% dos pacientes com tratamento endovascular, e menor mortalidade em comparação à cirurgia aberta [12].

A terapia endovascular é mais rápida e menos invasiva, sendo vantajosa em uma situação que o paciente está mais grave. Caso essa seja a terapia escolhida, o paciente deve permanecer monitorizado, pois em até 70% dos casos pode ser necessária laparotomia para ressecar o tecido necrótico intestinal [12].

Além do tratamento específico, devem ser corrigidas disfunções hemodinâmicas e alterações metabólicas que possam ocorrer. Pelo risco de perfuração ou translocação bacteriana, antibioticoterapia de amplo espectro é geralmente recomendada.

Na isquemia crônica, também é necessária a revascularização. Nesses casos é ainda mais comum o uso de terapias endovasculares. Nas isquemias não oclusivas, o objetivo principal é reverter a doença que causou o hipofluxo ou espasmo da artéria.

Em casos de trombose venosa, o tratamento é a anticoagulação. A etiologia da trombose deve ser pesquisada, especialmente em busca de trombofilias e patologias intra-abdominais que propiciaram o quadro.