MAPA, MRPA e diagnóstico de hipertensão

Criado em: 01 de Julho de 2024 Autor: Letícia Dal Moro Angoleri

Em 2024, a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) publicou a nova diretriz para as medidas da pressão arterial dentro e fora do consultório, incluindo a medida ambulatorial da pressão arterial (MAPA) e a medida residencial de pressão arterial (MRPA) [1]. Esse tópico revisa as diferentes maneiras de diagnosticar HAS.

Diagnóstico com medidas no consultório

A medida da pressão arterial (PA) em consultório é o método mais usado e mais estudado para diagnóstico de hipertensão arterial sistêmica (HAS). As Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial de 2020 e a diretriz da European Society of Hypertension (ESH) de 2023 recomendam que diagnóstico de HAS seja feito quando há pressão arterial sistólica (PAS) ≥ 140 mmHg e/ou pressão arterial diastólica (PAD) ≥ 90 mmHg em medida em consultório [2, 3]. Devem ser feitas três medidas em pelo menos duas consultas e considerada a média das duas últimas medidas de cada dia. Na primeira consulta, a PA deve ser medida em ambos os braços e o lado que tiver o valor mais alto será o utilizado para as próximas medidas. A tabela 1 traz as recomendações para as medidas e o critério diagnóstico.

Tabela1
Orientações para a medida padronizada de pressão arterial
Orientações para a medida padronizada de pressão arterial

Em pacientes com PAS ≥ 180 mmHg ou PAD ≥ 110 mmHg (HAS grau 3) o diagnóstico pode ser feito já na primeira consulta. O mesmo se aplica para pacientes que já possuem lesões de órgão-alvo associada a HAS.

O valor de pressão arterial considerado hipertensão pela diretriz da American Heart Association (AHA) de 2017 é 130/80 mmHg. Essa divergência foi discutida no tópico Comparação entre Diretrizes de Hipertensão.

A medida de PA pode ser realizada com a técnica auscultatória ou automatizada. A automatizada é mais recomendada por não ser dependente do examinador [1]. O aparelho semi-automático ou automático deve ser validado e calibrado a cada 12 meses.

Na primeira consulta, também deve ser pesquisada hipotensão postural em grupos de risco, como pessoas com disautonomia, idosos e usuários prévios de anti-hipertensivos [1]. Veja mais sobre o novo posicionamento da AHA sobre o manejo de hipotensão postural em pacientes hipertensos no tópico Hipotensão Ortostática.

Medida ambulatorial de pressão arterial (MAPA)

Na medida ambulatorial da pressão arterial (MAPA), um aparelho automatizado realiza medidas intervaladas durante 24h, em domicílio. Os principais parâmetros avaliados são a média da pressão arterial diurna, noturna e em 24 horas. A diretriz europeia de 2023 utiliza como critério para HAS uma média de pressão sistólica diurna ≥ 135 mmHg ou média de pressão diastólica diurna ≥ 85 mmHg. Existe divergência de corte entre as sociedades, como descrito na tabela 2.

Tabela 2
Valores de pressão na medida ambulatorial da pressão arterial (MAPA) e medida residencial da pressão arterial (MRPA)
Valores de pressão na medida ambulatorial da pressão arterial (MAPA) e medida residencial da pressão arterial (MRPA)

O exame consegue predizer lesão de órgão-alvo, desfechos e mortalidade melhor do que a medida em consultório [4, 5]. Por ser pouco disponível e mais caro, não é feito em todos os pacientes.

A MAPA é recomendada principalmente na suspeita das quatro condições abaixo:

  • Hipertensão do jaleco branco: paciente que não tem o diagnóstico de HAS, mas durante a medida em consultório apresenta PA elevada. A suspeita surge em pacientes com medidas normais fora do consultório, especialmente quando a PA está no nível de HAS grau 1 e na ausência de lesões de orgão alvo.
  • Hipertensão mascarada: paciente que tem HAS, mas durante medida em consultório não apresenta PA elevada. Deve ser considerada em pacientes com lesão de orgão alvo, com relato de PA elevada, especialmente com quando tem múltiplos fatores de risco e valores no limite superior da PA [6].
  • Hipertensão resistente: hipertensão resistente a três ou mais anti-hipertensivos. A MAPA é recomendada para confirmar o diagnóstico, quando há suspeita com medida em consultório.
  • Disautonomia: alterações da atividade do sistema nervoso autônomo levando a hipotensão ortostática, hipersensibilidade do seio carotídeo e outras condições clínicas.

Outras indicações de uso da MAPA estão na tabela 2.

Uma vantagem da MAPA é fornecer a pressão arterial durante o sono. No sono há uma queda de pressão arterial em 10 a 20%, chamada de descenso noturno. A ausência de descenso noturno (non-dippers) e o descenso noturno reverso (aumento da pressão no sono, reverse dippers) estão correlacionados com maior risco cardiovascular. A chance de síndrome da apneia e hipopneia do sono aumentou em 2,7 vezes com descenso ausente e em 3,5 vezes com o descenso reverso em um estudo [7].

Apesar disso, a ausência de descenso não orienta mudanças terapêuticas no uso de anti-hipertensivos [2]. Em 2022, o estudo TIME não encontrou diferença em eventos cardiovasculares entre o uso de anti-hipertensivos no período da manhã ou noite em pacientes com HAS [8].

A MAPA realiza outras medições como carga de pressão arterial, elevação matinal precoce e índice ambulatorial de rigidez arterial. Esses parâmetros continuam em estudo e a aplicação prática ainda é discutida.

Medida residencial da pressão arterial (MRPA)

As medidas de pressão operadas pelo paciente podem ser feitas de três maneiras [1]:

  • Medida residencial de pressão arterial (MRPA)
  • Automedida de pressão arterial (AMPA)
  • Medida desacompanhada de pressão arterial no consultório (MDPAC)

Na medida residencial da pressão arterial (MRPA), o paciente realiza diversas medidas intervaladas utilizando um aparelho automatizado. A MRPA está validada para o diagnóstico e controle de tratamento de HAS. Também é uma alternativa para o diagnóstico de hipertensão do jaleco branco e hipertensão mascarada, sendo inferior à MAPA pelas limitações no monitoramento noturno e diurno de forma contínua [3, 9].

O paciente é orientado a medir a PA por sete dias, preferencialmente consecutivos. Devem ser feitas pelo menos duas medidas com um minuto de intervalo entre elas, antes da tomada de anti-hipertensivos, pela manhã e à noite. O paciente deve seguir as mesmas orientações da tabela 1. É calculada uma média das pressões, excluindo as medidas do primeiro dia. Assim como a MAPA, os valores de corte são mais baixos, com média de pressão sistólica ≥ 135 mmHg ou média de pressão diastólica ≥ 85 mmHg.

A diretriz brasileira de MRPA sugere que o aparelho seja fornecido ao paciente e os resultados sejam analisados e laudados por médico treinado para essa função [1]. Já pelas diretrizes europeia e americana, o paciente pode utilizar o próprio aparelho, desde que automatizado, e o resultado pode ser avaliado pelo médico assistente.

Automedida da pressão arterial (AMPA) e medida desacompanhada de pressão arterial (MDPAC)

Na AMPA, o paciente mede a PA no domicílio aleatoriamente. Essa modalidade não tem validação para o diagnóstico e acompanhamento de seguimento de HAS, sendo a indicação principalmente para triagem e como segunda opção no controle de tratamento da hipertensão [1]. Apesar de não validada, é amplamente utilizada e foi incorporada pela diretriz brasileira de hipertensão [2]. A diretriz sugere pelo menos sete medidas com intervalo de tempo de 16 a 72 horas.

Na MDPAC, é feita medida da PA do paciente desacompanhado no consultório médico, com aparelho automático [10]. A vantagem dessa modalidade é avaliação de hipertensão do jaleco branco mesmo em consultório. Ainda é pouco difundida no Brasil.

Rastreio de Transtornos Psiquiátricos

Criado em: 01 de Julho de 2024 Autor: Raphael Coelho

Transtornos mentais são prevalentes e negligenciados. O estudo GET.FEEDBACK.GP foi publicado em abril de 2024 no Lancet Psychiatry e aborda o rastreio de depressão [1]. Este tópico discute o tema e traz os resultados do estudo.

Por que rastrear transtornos mentais?

A prevalência estimada de transtornos mentais na população mundial é de 13%. Um terço dessas pessoas têm transtornos de ansiedade ou depressivos. A prevalência de depressão maior na cidade de São Paulo é em torno de 15% durante a vida [2].

Problemas de saúde mental são negligenciados. Em 2019, a prevalência autorreferida de um diagnóstico de depressão foi de 10% em adultos. Porém, metade desses pacientes relatou não ter recebido atendimento médico para depressão no último ano [3].

Os pacientes podem não trazer ativamente os sintomas da depressão ao consultório. Algumas explicações para isso são a preocupação com a prescrição de medicamentos, quebra do sigilo médico ou acreditarem que não é função do médico generalista atender queixas psiquiátricas [3].

Um estudo dos Estados Unidos identificou que a mediana de tempo para tratamento a partir do início dos sintomas de ansiedade foi de 23 anos. Baixo nível socioeconômico e sexo feminino são associados a altas taxas de transtornos de ansiedade [4].

Tabela1
Rastreio de depressão e ansiedade, segundo diretrizes
Rastreio de depressão e ansiedade, segundo diretrizes

Por serem condições comuns, com impacto em morbimortalidade e terem tratamentos eficazes, os transtornos depressivos e de ansiedade são candidatos a estratégias de rastreio populacional (tabela 1).

Rastreio de depressão

A United States Preventive Service Task Force (USPSTF) recomenda o rastreio de depressão para toda a população adulta. Segundo a organização, o rastreio aumenta a detecção, a taxa de tratamento e os desfechos. Há menor prevalência de depressão em seis meses e maiores taxas de remissão após o rastreio [5].

Tabela 2
Questionário PHQ-9 para rastreio de depressão
Questionário PHQ-9 para rastreio de depressão

Há algumas ferramentas validadas para o rastreio de depressão (tabelas 2 e tabela 3). Os instrumentos mais usados são o Patient Health Questionnaire (PHQ) e, em idosos, a Geriatric Depression Scale (GDS). A GDS não inclui sintomas somáticos, o que pode ser uma vantagem em idosos com comorbidades levando a sintomas físicos que podem ser confundidos com depressão.

Tabela 3
Escala GDS-15 para rastreio de depressão
Escala GDS-15 para rastreio de depressão

A frequência de rastreio não é bem definida. Uma estratégia possível é estruturar em duas etapas. A primeira deve ser mais rápida e sensível, e a segunda, mais longa e específica, só aplicada se a primeira etapa for positiva. Para a primeira etapa, as duas primeiras perguntas do PHQ-9 podem ser utilizadas, seja pelo médico ou como um questionário respondido pelo paciente (PHQ-2). Se o paciente responder “sim” a uma das duas perguntas ou pontuar 2 ou mais no PHQ-2, a segunda etapa pode ser realizada com o PHQ-9 ou GDS (opção na população geriátrica). A tabela 4 compara o desempenho das ferramentas.

Tabela 4
Comparação entre ferramentas de rastreio de depressão e ansiedade
Comparação entre ferramentas de rastreio de depressão e ansiedade

Após o rastreio positivo, o diagnóstico de transtorno depressivo maior deve ser confirmado pela anamnese, segundo os critérios do DSM-V. Algumas condições podem positivar o rastreio e devem ser diferenciadas de depressão maior, entre elas o transtorno depressivo persistente, depressão menor, transtorno de luto prolongado e transtorno bipolar. O número de falsos positivos de depressão é considerável. O acompanhamento dos pacientes com avaliações periódicas pode esclarecer a dúvida entre o diagnóstico de depressão ou outra condição [6].

Rastreio de ansiedade

Pacientes com transtornos de ansiedade têm medo e ansiedade excessivos, causando sofrimento. Os transtornos de ansiedade diferem entre si nos tipos de objetos ou situações que induzem os sintomas. Alguns exemplos são: ansiedade generalizada, ansiedade de separação, ansiedade social, pânico, fobias, mutismo seletivo, agorafobia e induzido por medicamento ou substância.

A USPSTF recomenda o rastreio de ansiedade para todos os adultos até 65 anos. Após essa idade, não há evidência suficiente de benefício [5].

As principais escalas validadas no Brasil que podem ser utilizadas para rastreio são Generalized Anxiety Disorder Scale (GAD), Edinburgh Postnatal Depression Scale (EPDS) e Geriatric Anxiety Inventory (GAI) [7].

Tabela 5
Escala para rastreio de ansiedade GAD-7
Escala para rastreio de ansiedade GAD-7

As ferramentas de rastreio mais estudadas são a GAD-7 e a GAD-2, que compreende apenas as duas primeiras perguntas da GAD-7 (tabela 5). A estratégia de realizar o rastreio em duas etapas, similar a de depressão, também pode ser usada nesse caso. Uma sugestão é usar inicialmente a GAD-2 (mais sensível) e, caso positiva, prosseguir com a aplicação da GAD-7 (mais específica) (tabela 4) [8]. O intervalo adequado para repetir o rastreio não é bem definido.

Figura 1
Rastreio de depressão e ansiedade
Rastreio de depressão e ansiedade

Um rastreio positivo para ansiedade generalizada deve ser confirmado com a aplicação de critérios diagnósticos, conforme descrito na figura 1.

Estudo GET.FEEDBACK.GP: como comunicar o rastreio positivo?

Existem dúvidas sobre o impacto dos programas de rastreio de depressão e o que um programa deve ter para melhorar os desfechos para os pacientes. Apenas 37% dos indivíduos de um estudo italiano aceitaram tratamento para depressão após o rastreio positivo [9]. Por outro lado, o estudo DEPSCREEN-INFO mostrou que informar os pacientes e os médicos sobre o rastreio positivo com material educativo reduziu a gravidade da depressão após seis meses, em comparação a informar apenas os médicos [10].

O GET.FEEDBACK.GP avaliou como e quem informar sobre o rastreio positivo de depressão. O trabalho foi um ensaio clínico randomizado, multicêntrico, prospectivo, feito em 64 centros de atenção primária na Alemanha. Os pacientes foram recrutados na sala de espera de consulta de médico generalista e preencheram o PHQ-9 para rastreio de depressão. Mais de 1000 pacientes foram incluídos e 80% da população tinha mais de 10 anos de educação formal.

A amostra foi randomizada em três grupos. No primeiro, ninguém recebeu informações do resultado do rastreio. No segundo, o médico recebeu uma carta com recomendação para abordar depressão na consulta, pois o rastreio havia sido positivo, e o paciente recebeu uma carta de agradecimento por participar do estudo. No terceiro, o médico recebeu a mesma carta do segundo grupo e o paciente recebeu uma carta informando o rastreio positivo para depressão, material educativo e recomendação para abordar a questão na consulta. Tanto os médicos quanto a equipe de pesquisa que entregavam as cartas estavam cegados quanto ao conteúdo escrito.

O desfecho primário era a gravidade da depressão após seis meses da randomização. Não houve diferença significativa no desfecho primário entre os grupos.

No grupo em que médicos e pacientes foram informados sobre o rastreio positivo, houve maiores taxas de abordagem de depressão e mais informações entregues pelos médicos. Os pacientes deste grupo também tiveram menor gravidade de sintomas somáticos. Não houve diferença para os outros desfechos secundários que incluíam escalas de ansiedade, qualidade de vida, satisfação e tratamento da depressão.

O tempo para início de tratamento de depressão foi semelhante entre os grupos. Menos de 25% dos pacientes com rastreio positivo foram tratados com psicoterapia ou medicamento.

Os resultados ilustram a dificuldade de implementar um programa de rastreio de depressão que modifique desfechos maiores. Os desfechos secundários sugerem algum benefício de fornecer informações por escrito para o paciente e o médico, mas novos estudos devem avaliar que outras intervenções podem aumentar o impacto dos programas de rastreio.

Síndromes e Cenários

Eutireoideo Doente e Função Tireoidiana no Paciente Hospitalizado

Criado em: 01 de Julho de 2024 Autor: Joanne Alves Moreira

A análise da função tireoidiana sofre muitas interferências no paciente hospitalizado, dificultando a interpretação clínica. A alteração dos exames tireoidianos em uma doença sistêmica não tireoidiana é denominada síndrome do eutireoideo doente. Esse tópico revisa o tema.

Eutiroideo doente: definição e mecanismo

A síndrome do eutireoideo doente (SED) é definida como uma alteração dos exames de função tireoidiana em pacientes com doenças agudas ou crônicas, sem evidências de doença tireoidiana própria [1].

Vários mecanismos estão envolvidos na SED. As principais alterações ocorrem na atividade das iodotironina deiodinases, enzimas responsáveis pela conversão de T4 em T3 ou em T3 reverso (rT3), e na secreção de hormônio estimulador da tireoide (TSH).

Em uma doença aguda, a inibição da atividade da iodotironina deiodinase de tipo 1 (D1) reduz a conversão periférica de T4 em T3. Em doenças mais graves ou prolongadas, os níveis de T4 total e livre também podem diminuir. O valor do TSH geralmente está dentro dos limites da normalidade ou discretamente reduzido, refletindo uma supressão do eixo hipotálamo-hipófise-tireoide [1].

Parte dessas alterações podem corresponder a mecanismos adaptativos ao processo de adoecimento [2].

Medicamentos e doenças que alteram os exames tireoidianos

Alguns medicamentos podem alterar os exames tireoidianos sem afetar a função tireoidiana verdadeiramente. Outros alteram a função tireoidiana de fato (tabela 1).

Tabela1
Medicamentos que alteram os exames e/ou função tireoidiana
Medicamentos que alteram os exames e/ou função tireoidiana

Sepse, neoplasias, doenças cardíacas agudas e doentes em condições críticas podem exibir alterações nos exames tireoidianos. Condições que levam ao estresse fisiológico intenso (trauma, cirurgias e disfunções orgânicas) também estão envolvidas nessas alterações.

Avaliação da função tireoidiana no paciente internado

A função da tireoide não deve ser avaliada em pacientes graves, exceto se houver forte suspeição de doença tireoidiana. Os exames de função tireoidiana sofrem muitas interferências nesse contexto, dificultando a interpretação. A despeito disso, alguns pacientes graves têm como explicação para o quadro uma tireoidopatia (levando a coma mixedematoso ou tempestade tireotóxica, por exemplo), surgindo a necessidade de avaliação da função glandular se houver esse tipo de suspeita. Veja mais no tópico Coma Mixedematoso.

O perfil laboratorial típico de um paciente com SED é composto por T4 livre e TSH normais ou baixos e T3 baixo. Já o T3 reverso (rT3), se disponível, costuma estar alto [3].

Na suspeita clínica de doença tireoidiana no paciente internado, deve-se solicitar TSH e T4 livre. Se disponíveis, T3 e T4 totais podem ajudar no entendimento do quadro. O passo inicial da interpretação pode ser baseado no valor do TSH.

TSH baixo

Um TSH baixo com T4 livre elevado em um paciente hospitalizado significa SED na maioria das vezes. Contudo, alguns pacientes de fato terão hipertireoidismo. Nesse contexto, a dosagem de T3 e o grau de supressão do TSH podem ser úteis. Espera-se um T3 reduzido na SED, enquanto no hipertireoidismo está elevado.

Apesar de não ser definitivo, o nível de supressão do TSH também pode ajudar. Níveis discretamente reduzidos quase sempre representam SED. Valores abaixo de 0,05 mUI/L ou indetectáveis aumentam a chance de hipertireoidismo verdadeiro. Utilizando um ensaio de TSH de terceira geração, apenas 5 de 37 pacientes com SED tinham TSH < 0,005 mUI/L [4, 5].

Outros achados sugestivos de hipertireoidismo (como bócio, fibrilação atrial, tremores, perda de peso) devem ser considerados na interpretação. Uma nova dosagem após resolução da doença que motivou a internação é recomendada em casos de dúvida.

TSH alto

Apesar de SED habitualmente reduzir o TSH, alguns pacientes podem apresentar níveis elevados de TSH durante a recuperação clínica. A magnitude do aumento de TSH pode ajudar a diferenciar de hipotireoidismo verdadeiro. Valores de TSH acima de 20 mU/L associados a um T4 livre baixo aumentam consideravelmente a possibilidade de hipotireoidismo. Nesse caso, deve-se iniciar tratamento e avaliar a presença de coma mixedematoso [6].

Se o valor de TSH estiver entre o limite superior da normalidade e 10-20 mU/L, deve-se avaliar o T4 livre e, se estiver baixo, considerar início de tratamento para hipotireoidismo caso haja alta suspeita clínica. Em caso de dúvida, pode-se repetir os exames em uma a duas semanas [7].

Para pacientes que possuem TSH elevado, porém T4 livre normal, recomenda-se repetir os exames em uma a duas semanas [7].

Manejo do paciente eutireoideo doente

Para pacientes com baixos níveis dos hormônios tireoidianos, porém sem evidência de doença primária da tireoide, a reposição hormonal não é recomendada [8]. A reposição não mostrou benefício em desfechos de mortalidade, arritmias ou uso de vasopressores [9].

Valores baixos de T3 livre estão associados com aumento do tempo de internação e necessidade de ventilação mecânica na insuficiência cardíaca descompensada, sendo uma alteração com significado prognóstico [10]. Em uma análise semelhante, a presença de SED foi considerada um preditor de mortalidade em 30 dias em pacientes com pneumonia adquirida na comunidade [11].

Apesar desses dados, o objetivo deve ser o tratamento da doença de base, sendo a avaliação dos hormônios tireoidianos uma medida indireta da gravidade [12]. Com a melhora de condição de saúde, ocorre o restabelecimento dos níveis hormonais [5]. A normalização dos exames pode levar meses após a alta, não sendo necessária intervenção farmacológica [13].