Mpox (Monkeypox)

Criado em: 09 de Setembro de 2024 Autor: Frederico Amorim Marcelino

A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou em agosto de 2024 que os casos de mpox (a antiga monkeypox) em países africanos são uma emergência de saúde pública de preocupação internacional. O tópico "Mpox" revisa o diagnóstico e o manejo dessa doença.

Situação atual

A mpox, antes chamada de monkeypox, é causada por um vírus do gênero Orthopoxvírus, similar à varíola. É transmitida por contato direto com lesões de pele ou fluidos corporais da pessoa infectada, incluindo contato sexual, contato com objetos e superfícies contaminados e com secreções respiratórias. A doença pode ser adquirida e transmitida para mamíferos. O tempo entre o contato e a manifestação dos sintomas é de 3 a 21 dias, com média de 7 a 9 dias [1, 2]. No surto de 2022, 95% dos pacientes eram homens que fazem sexo com homens.

O aumento de casos e o surgimento de uma nova variante de mpox levou a OMS a declarar emergência de saúde pública de preocupação internacional em 14 de agosto de 2024. A declaração visa mobilizar recursos internacionais, simplificar o financiamento e acelerar o desenvolvimento de vacinas, tratamentos e métodos diagnósticos sob autorização de uso emergencial. No Brasil, até o início de agosto de 2024, 709 casos foram registrados no Ministério da Saúde, predominando em São Paulo e Rio de Janeiro.

Apresentação clínica

A lesão inicial aparece no local provável de inoculação. Começa como mácula, evoluindo para pápula, vesícula e depois para pseudo-pústulas (figura 1). As pseudo-pústulas são pápulas que se assemelham a pústulas, mas o conteúdo é sólido, ao invés de líquido e purulento [3]. O centro pode se tornar necrótico e eventualmente as lesões assumem um aspecto umbilicado. Ao final, as lesões evoluem para crostas.

Figura 1
Exemplo de pseudo-pústula.
Exemplo de pseudo-pústula.

As lesões ocorrem mais comumente nos genitais, face, braços, mãos e região perianal. Podem ser únicas ou múltiplas, com mais de 50% dos casos tendo de duas a dez lesões, e eventualmente surgem em estágios diferentes de desenvolvimento [4]. Os pacientes com frequência sentem dor no local e alguns precisam de internação hospitalar para analgesia. Lesões confluentes podem causar edema importante causando obstrução uretral e retal. Quadros disseminados são descritos em imunossuprimidos.

A lesão inicial pode se apresentar de formas diferentes, a depender da localização. Lesões em mucosas tendem a se manifestar como úlceras. Nos dedos, a lesão pode se apresentar como paroníquia (inflamação periungueal). A OMS e o Centers for Disease Control and Prevention (CDC) disponibilizam gratuitamente imagens de mpox (veja aqui as imagens de mpox da OMS e do CDC).

Sintomas sistêmicos estão presentes na maioria dos pacientes (80 a 95%), principalmente febre, mialgia, linfonodomegalia, dor de garganta e cefaleia [1, 5]. Os sintomas podem aparecer antes das lesões de pele em mais da metade dos casos. Manifestações graves como encefalite, pneumonia e miopericardite podem ocorrer em pacientes com HIV.

O diagnóstico é feito por detecção do vírus por reação em cadeia de polimerase quantitativa (qPCR). A coleta pode ser feita por swab em lesões de pele, orofaringe ou mucosas, assim como coleta da própria crosta para análise. Veja mais detalhes sobre o diagnóstico de mpox na nota informativa do ministérios da saúde. A suspeita de mpox é de notificação imediata, em até 24 horas.

Tratamento e prevenção

Deve-se adotar precauções de contato e gotículas com proteção ocular, máscara cirúrgica, avental e luvas descartáveis durante o cuidado de casos suspeitos ou confirmados de mpox. Máscara N95 ou equivalente deve ser adotada em procedimentos que gerem aerossóis. O caso confirmado de mpox deverá se manter em isolamento até que a erupção cutânea esteja totalmente resolvida, ou seja, até que todas as crostas tenham caído e uma nova camada de pele intacta tenha se formado. O tempo de transmissão médio em um estudo foi de 25 dias [6].

A maioria dos pacientes com mpox terá doença leve e podem ser tratados ambulatorialmente com suporte clínico. Os principais motivos de internação durante o surto de 2022 foram infecção bacteriana secundária, dor retal e perianal e acometimento ocular [5, 7]. 

O tecovirimat é um antiviral atualmente em investigação para o tratamento de mpox. Estudos pré-clínicos mostraram eficácia em modelos animais. A medicação foi usada em pacientes com mpox no surto de 2022, mas faltam estudos randomizados. O Centers for Disease Control and Prevention (CDC) dos Estados Unidos publicou um protocolo de acesso à medicação para imunossuprimidos, pacientes com manifestações graves ou em risco para manifestações graves. No Brasil, o Ministério da Saúde adquiriu uma pequena quantidade de medicação. Para obtê-la, deve ser realizado contato com mpox@aids.gov.br para avaliação técnica. 

A vacinação contra mpox é recomendada para pessoas vivendo com HIV sendo homens cisgênero, travestis e mulheres trans com idade maior ou igual a 18 anos e profissionais de laboratório que trabalham diretamente com Orthopoxvírus. Pode ser usada também como profilaxia pós-exposição. No momento os estoques estão esgotados na maior parte dos estados. O Brasil está em negociação para aquisição de novas vacinas da mpox

Como Fazer

Extubação: Cuidados e Como Fazer

Criado em: 09 de Setembro de 2024 Autor: Kaue Malpighi

A falha de extubação possui uma incidência em torno de 15% e está associada a piores desfechos e aumento da mortalidade [1]. O tópico “Extubação: Cuidados e Como Fazer” revisa o processo de extubação, incluindo avaliação neurológica, proteção de via aérea, testes respiratórios e outros passos para um procedimento adequado.

Avaliação neurológica e de proteção de via aérea

Os seguintes parâmetros devem ser avaliados antes de conduzir a extubação de um paciente:

  • Nível neurológico e proteção de via aérea
  • Aptidão respiratória e testes de respiração espontânea (TRE) - veja a tabela 1.
  • Risco de estridor pós extubação e teste do cuff-leak
Tabela 1
Critérios para considerar desmame da ventilação mecânica.
Critérios para considerar desmame da ventilação mecânica.

Com relação ao momento de iniciar TRE e os métodos disponíveis, veja o tópico "Desmame de Ventilação Mecânica e Testes de Respiração Espontânea".

A retirada do tubo orotraqueal necessita que o paciente se mantenha acordado e obedeça  a comandos. Essa avaliação pode ser difícil na presença de doenças neurológicas, o que pode atrasar a extubação.

A escala de coma de Glasgow é frequentemente utilizada como parâmetro neurológico para extubação, porém a sua capacidade de predizer falha é ruim. Muitos pacientes com Glasgow menor ou igual a 8 podem ter extubação bem sucedida e atrasar o procedimento unicamente por esse fator pode aumentar o risco de pneumonia associada a ventilação e os custo da internação [2, 3]. Uma avaliação mais ponderada da proteção de via aérea deve incluir:

  • Capacidade de obedecer comandos
  • Pico de fluxo da tosse
  • Volume de secreção

Quatro tarefas podem ser avaliadas na capacidade de obedecer comandos: abrir os olhos, olhar para o examinador, apertar a mão e mostrar a língua. A execução desses comandos é um preditor de sucesso de extubação melhor que o Glasgow [4].

Para avaliar o manejo de secreções da via aérea, o paciente deve ter um reflexo de tosse adequado e um baixo volume de secreção. Um pico de fluxo de tosse menor que 60 L/min e um volume de secreção maior que 2,5 mL/hora estão associados a aumento do risco de falha [5].

A avaliação dos comandos, do reflexo de tosse e quantidade de volume de secreção deve ser feita conjuntamente. Nos casos em que os três parâmetros estão inadequados, a taxa de falha se aproxima de 100%, independente do sucesso nos testes de respiração espontânea [5].

Teste de respiração espontânea e suporte não invasivo após extubação

O paciente deve ter realizado um TRE satisfatório para avaliar a aptidão respiratória para extubação. Contudo, mesmo após um TRE bem-sucedido, deve-se sempre avaliar se existe alto risco para falha por insuficiência respiratória, já que a ventilação não invasiva (VNI) após a extubação pode reduzir a probabilidade de falha.

Os critérios de alto risco de insuficiência respiratória após extubação não são consensuais e as diretrizes mencionam doenças cardiopulmonares e outras doenças graves, sem especificá-las [6, 7]. Recomenda-se que pacientes considerados de alto risco recebam VNI preventiva logo após a extubação por um período de 48 horas para reduzir risco de falha. Os estudos que encontraram benefício com essa intervenção utilizaram os seguintes parâmetros como critério de inclusão [6, 8]:

  • Idade maior 65 anos ou;
  • Qualquer doença cardiovascular (fração de ejeção ≤ 45%, edema pulmonar prévio, cardiopatia isquêmica ou fibrilação atrial) ou;
  • Qualquer doença pulmonar (DPOC, síndromes de hipoventilação ou doença pulmonar restritiva) ou;
  • Obesidade [9]

Estudos que evidenciaram benefício da VNI neste cenário realizaram mais de 8 horas por dia com uma média de 22 horas de ventilação não invasiva em 48 horas [7, 10]. O cateter nasal de alto fluxo pode ser utilizado entre as sessões de VNI [7, 11].

Outra aplicação da VNI é a estratégia conhecida como "VNI facilitadora". Esta técnica envolve extubação e início imediato da VNI mesmo em pacientes que não passaram no TRE e ainda apresentam necessidade de pressões de suporte baixas (pressões entre 8 a 12 cmH₂O). Esta estratégia pode reduzir tempo de ventilação mecânica sem aumentar riscos e parece mais benéfica em pacientes com DPOC com desmame dificultado (48 a 72 horas de desmame) [12].

Risco de estridor pós extubação e teste do cuff-leak

Estridor após extubação pode ocorrer em até 10% dos pacientes. A causa mais comum é o edema de laringe e pregas vocais. Outras causas de menor frequência são lesão laríngea pela intubação, presença de secreção espessa e estenose de traqueia [13].

A ocorrência de estridor está associada a alguns fatores de risco vistos na tabela 2 [13-15].

Tabela 2
Fatores de risco para estridor após extubação.
Fatores de risco para estridor após extubação.

Em pacientes que apresentem estes fatores, deve-se realizar o teste do cuff leak (ou teste do vazamento do balonete) antes da extubação. O teste tem baixo valor preditivo positivo e deve ser utilizado apenas para o perfil de pacientes acima, para não atrasar o processo de extubação [16, 17].

O teste do cuff leak é feito ao desinsuflar o balonete do tubo traqueal, avaliando a passagem de ar com a ausculta da traqueia ou por meio da observação dos volumes na ventilação mecânica. Ao desinsuflar o balonete, espera-se que ocorra a ausculta da passagem de ar ou que a diferença entre o volume inspiratório e expiratório no ventilador seja maior que 110 mL (ou seja, o volume inspiratório aferido pelo ventilador é maior que o expiratório). Essa diferença de volumes indica a presença de um vazamento ao redor do balonete desinsuflado, sugerindo que existe espaço entre o tubo e a traqueia e a via aérea não está significativamente obstruída. Se não houver ausculta ou a diferença dos volumes for menor que 110 mL, o teste é positivo e há maior risco de estridor após a extubação [18, 19]. 

Em pacientes com cuff leak positivo, recomenda-se o uso de corticoide (metilprednisolona 40 mg) intravenoso 4 horas antes de programar a extubação. Não é recomendado repetir o teste após este período para fazer a extubação. Caso ocorra estridor após a extubação, há recomendação de realizar nova dose de corticoide e adrenalina em nebulização. Em caso de persistência, considerar reintubação. O uso da VNI nestes casos não é recomendado por estar associada a aumento de mortalidade, possivelmente por atrasar a intubação sem acrescentar benefício [14, 20].

O que mais avaliar e como preparar a extubação

Outros parâmetros devem ser avaliados antes da extubação, mas isoladamente não contraindicam o procedimento:

  • Uso de droga vasotiva - doses de noradrenalina acima de 0,1 mcg/kg/min, principalmente com sinais de choque, pode estar associada a aumento do risco de falha de extubação [21].
  • Jejum - deve ser reservado apenas para pacientes com alto risco de broncoaspiração. Um estudo do Lancet de 2023 encontrou não inferioridade de manutenção da dieta enteral contra jejum de 6 horas em relação ao risco de reintubação e pneumonia [22].

Veja um passo a passo da avaliação da extubação e condutas para pacientes de risco no fluxograma 1.

Fluxograma 1
Fluxograma para avaliação de extubação.
Fluxograma para avaliação de extubação.

No momento da extubação, material para suporte de oxigênio e ventilação não invasiva devem ser separados conforme a avaliação de risco. O decúbito do paciente deve ser elevado para mantê-lo sentado e a via aérea baixa e a cavidade oral deve ser aspirada. Em pacientes com risco de estridor, o teste do cuff leak pode ser realizado neste momento, se não foi realizado antes. As fixações do tubo orotraqueal são retiradas, solicita-se para o paciente inspirar profundamente e exalar ou tossir após. No momento da exalação, o balonete é desinsuflado e o tubo retirado em um único movimento. Veja um vídeo sobre os passos da extubação aqui

Lesão Hepática Induzida por Drogas (DILI)

Criado em: 09 de Setembro de 2024 Autor: Pedro Rafael Del Santo Magno

A lesão hepática induzida por drogas (também chamada de DILI, do inglês drug induced liver injury) é uma das principais causas de insuficiência hepática aguda. A DILI pode ser responsável por até 4% das internações por icterícia [1]. Um artigo do Journal of the American Medical Association (JAMA) Internal Medicine avaliou os principais medicamentos relacionados a DILI [2]. Este tópico aborda os resultados do estudo e o manejo do paciente com DILI.

Abordagem do paciente com suspeita de DILI

O diagnóstico de DILI é baseado na exclusão de outras causas de lesão hepática. Não há exames laboratoriais ou escores clínicos que confirmem que a lesão foi causada por medicamentos. A diretriz da American College of Gastroenterology (ACG) recomenda como investigação inicial a pesquisa de sorologias virais, marcadores de hepatite autoimune e exames de imagem para avaliar obstrução de via biliar. A biópsia hepática não é obrigatória, mas pode auxiliar quando há incerteza diagnóstica relevante após exames não invasivos.

Após suspeitar de DILI, o próximo passo é caracterizar o padrão da lesão hepática do paciente e avaliar o comportamento da hepatotoxicidade caso a droga suspeita seja de fato a causadora do quadro. Quatro características devem ser avaliadas [3]:

  • Latência: tempo do início da lesão hepática após introdução da droga.
  • Retirada: melhora dos sintomas após a retirada da droga.
  • Re-exposição: recorrência da lesão hepática, caso a droga seja reintroduzida.
  • Fenótipo: se o padrão da lesão hepática da droga corresponde ao que o paciente apresenta
  • Os medicamentos têm latência e fenótipos diferentes. Exemplos de fenótipos estão na tabela 1.
Tabela 1
Fenótipos de lesão hepática induzida por drogas.
Fenótipos de lesão hepática induzida por drogas.

O mecanismo de lesão hepática por drogas pode ser direto ou idiossincrático. Na lesão direta, a latência é de dias e varia conforme a dose. Os principais exemplos desse mecanismo de lesão são o paracetamol e metotrexato. Quando o acometimento é idiossincrático, não há correlação com a dose e a latência varia de dias a anos. Exemplos de drogas com acometimento idiossincrático são amoxicilina-clavulanato, isoniazida e quinolonas.

Uma das maneiras de pesquisar como se comporta a lesão por cada droga é pelo site Livertox, que agrupa informações de mais de 1200 drogas e o respectivo efeito no fígado [4].

Padrão de lesão

A DILI pode ser dividida em três padrões: hepatocelular, colestático e misto. Esses padrões são caracterizados com o cálculo da “razão R” através de uma fórmula que utiliza valores de TGP e fosfatase alcalina (FA) - figura 1.

Figura 1
Razão R - Fórmula e interpretação
Razão R - Fórmula e interpretação

TGP e FA possuem valores de referência diferentes e se elevam em proporções distintas. Uma comparação direta entre os valores resultaria em uma análise imprecisa. Uma maneira de ajustar os valores dos exames considerando essas diferenças é dividir cada um pelo respectivo limite superior da normalidade. O resultado dessa operação expressa quantas vezes acima do limite superior da normalidade cada exame está alterado. Em seguida, os resultados são comparados e o valor final é chamado de razão R. Veja esta calculadora da razão R para facilitar a operação.

Se a razão R for superior a 5, o padrão é hepatocelular. Se menor que 2, padrão colestático. Valores entre 2 e 5 são classificados como padrão misto. Cada droga causa DILI com um padrão mais frequente, por exemplo [5]: 

  • Hepatocelular: paracetamol, alopurinol, ciprofloxacino
  • Colestático: amoxicilina com clavulanato, clorpromazina
  • Misto: amoxicilina com clavulanato, carbamazepina, clindamicina
Tabela 2
Recomendações para investigação da lesão hepática induzida por drogas, segundo o American College of Gastroenterology.
Recomendações para investigação da lesão hepática induzida por drogas, segundo o American College of Gastroenterology.

A tabela 2 traz as recomendações da ACG baseado nos padrões de acometimento. Para uma abordagem mais ampla a elevação de enzimas hepáticas, consulte o tópico "Abordagem à Elevação de Enzimas Hepáticas".

Tratamento e prognóstico

O tratamento de DILI é baseado em medidas de suporte. A droga causadora deve ser suspensa e o paciente não deve tomá-la novamente. A reexposição pode ocorrer quando há falha em reconhecer o medicamento como causador da DILI. Os únicos antídotos específicos para DILI são N-acetilcisteína para paracetamol e L-carnitina para ácido valproico. Veja mais sobre intoxicação por paracetamol no tópico "Consenso de Intoxicação por Paracetamol".

Os corticoides têm papel incerto no tratamento da DILI. Os estudos encontraram maior benefício em casos de hepatite autoimune induzida por drogas e DILI provocada por inibidores de check-point. Minociclina e nitrofurantoína são exemplos de medicamentos que podem induzir hepatite autoimune [6].   

Espera-se uma redução de 50% dos valores dos exames laboratoriais em 60 dias para DILI do padrão hepatocelular e 180 dias para DILI do padrão colestático. Pacientes que não apresentam essa evolução são candidatos a biópsia hepática para avaliar outras explicações para a lesão [7].

Os pacientes devem ser monitorados para o surgimento de coagulopatia e encefalopatia hepática, já que 10% evoluem para insuficiência hepática aguda [8]. Nesses casos, o tratamento é o transplante hepático. 

A N-acetilcisteína já foi estudada em DILI com insuficiência hepática, mesmo quando a causa não foi o paracetamol. Os resultados não evidenciaram diferença de sobrevida, mas em desfechos secundários houve menos evolução para transplante em pacientes com encefalopatia hepática grau 1 e 2 [9]. A diretriz da ACG pontua que N-acetilcisteína pode ser considerada nesse cenário.  

Não há consenso sobre qual escore utilizar para monitorar a gravidade desses casos, podendo ser utilizado o MELD, o SOFA ou os critérios de King's College

O que o trabalho acrescentou?

Em agosto de 2024, foi publicado um estudo de coorte retrospectiva analisando pacientes que receberam receita de medicações orais em um hospital dos Estados Unidos [2]. O desfecho primário foi hospitalização por lesão hepática aguda grave, definido como aumento de bilirrubina associado a um dos seguintes: transaminases elevadas três vezes acima do valor de referência ou INR superior a 1,5. 

Foram avaliados mais de 7,8 milhões de pacientes que receberam alguma medicação via oral com potencial para hepatotoxicidade. Ocorreram 1739 hospitalizações por lesão hepática aguda grave. Os prontuários eram analisados por dois hepatologistas que julgavam se a medicação havia causado ou contribuído para a lesão.

O estudo encontrou 17 medicações com número de eventos significativos. Os antimicrobianos representaram 64% dos medicamentos com alto risco de lesão. O metronidazol foi o principal antibiótico envolvido em hepatotoxicidade e as quinolonas possuem três representantes na lista. A classe de antipsicóticos tem dois representantes, incluindo a clorpromazina, utilizada em vários contextos. A lista está na tabela 3. Das 1739 hospitalizações, cinco pacientes realizaram transplante e 473 (27,2%) faleceram em até 180 dias.

Tabela 3
Principais medicamentos associados a lesão hepática aguda grave.
Principais medicamentos associados a lesão hepática aguda grave.

O estudo reforça a vigilância de lesão hepática com o uso de drogas como isoniazida, amoxicilina/clavulanato e clorpromazina. Além disso, indica que algumas medicações consideradas com baixa taxa de hepatotoxicidade, como metronidazol e ciprofloxacino, merecem maior atenção.